Dirceu Aparecido de Carvalho (*)
No último dia 27, precisamente, às 21:15 horas, na UTI do Hospital São Paulo, o “bom baiano” Tobias Alves de Carvalho fechava, atendendo o designo de Deus, as cortinas de um palco que foi a sua vida iniciada em 05 de fevereiro de 1906 na bucólica Mamonas de Monte Alto, Município de Laranjeiras, no sertão da Bahia.
Não gostava de ser chamado de baiano mas amou, como poucos, a terra de Ruy Barbosa, de Caetano e Gil.
Ferroviário, desde o dia 03 de janeiro de 1932, soube amar a extinta Estrada de Ferro de Araraquara, também de saudosa memória pela vontade dos homens, dignificou a profissão que abraçou – pedreiro. Aposentado desde o final da década de 50 fez a sua história residindo na casa de nº 47 da avenida Barroso, depois na Vila Andrade nº 68, rua Sargento Assad Ferez, 40. Gostava de criar cabras, porcos e galinhas em uma luta crescente, digna e honrada. De uma coragem ímpar certa vez foi à Delegacia de Polícia e disse ao Delegado: “Dr. quero que o senhor mande prender o fulano de tal que roubou as minhas galinhas. Após algumas considerações o Delegado mandou fazer a averiguação e o fato foi constatado. Tratava-se de um dos maiores “gatunos” de Araraquara.
Idolatrava sua mãe, fazendo restrições ao carinho não recebido de seu pai. Era um agregador da família e sempre preocupado com todos. Sempre estendeu suas mãos aos familiares, recebendo, em vida, o carinho necessário a suportar as dores que o levou ao leito por aproximadamente 200 dias.
No seu dicionário não havia a palavra “não” para as grandes tarefas. Católico por excelência, devoto de Nossa Senhora do Perpétuo Socorro, freqüentador da Igreja de Santa Cruz, sempre praticou a filantropia amparando seus irmãos araraquarenses, sem nunca esquecer aqueles amigos da cidade onde nascera. Lá, dizia ele, não há ricos ou pobres. No sertão da Bahia há somente aqueles que necessitam das nossas ações para sobreviverem.
Depois de passar pela região de São José do Rio Preto trabalhando na lavoura cafeeira, adotou Araraquara como sua cidade do coração. Realizando o sonho de ser empregado de uma estrada de ferro pensou em formar família. Foi à Bahia casar-se com Anízia Rodrigues Malheiros e viu seu reino brilhar mais intensamente com a vinda dos filhos: Dirceu, Valter, Maria Augusta e Paulo. Vieram as noras Jandira, Antonia e Eunice e o genro Vanderlei. Mas este reino que era todo seu floriu com os netos: Débora, Dorli, Fernando, Alexandra, Giseli, Daniela e Taís e os bisnetos: Maria Carolina, André, Bruno, Cauê, Tainá, Maria Beatriz, Lara e Bruna. Adotou carinhosamente como netos: Marcos, José Luiz, Paulo e Lucélia. Guardou, silenciosamente, no peito a grande dor da partida de seu filho Valter, prematuramente. Dividiu esta tristeza com a esposa, sabendo dar à nora e aos netos uma dose dupla de carinho e apoio.
Era extremamente sociável, adorava sair pela cidade, contemplar suas praças e logradouros. Era um amante do cinema. Não comprava um ingresso e sim dezenas. O objetivo da aquisição por atacado era a de facilitar o trabalho do dia seguinte pois sabia, com certeza, que lá estaria para saciar o seu “robe” predileto. Certa vez foi contemplado pelo Roberto Graciano, proprietário de nossas casas cinematográficas, com uma permanente. Isto simboliza o amor a esta arte. Não freqüentou escolas em sua infância entretanto poderíamos dizer que era um autodidata. Trabalhou como ferroviário, na construção do Estádio da Ferroviária, por não suportar o futebol, jamais voltou ao “campo”.
Respeitador de nossas autoridades foi amigo dos ex-prefeitos Rômulo Lupo e Benedito de Oliveira, entretanto, era fã de carteirinha de Valdemar de Santi. Jamais omitiu os seus pensamentos, ainda que isto lhe acarretasse alguns dissabores. Não havia segredos em sua vida, daí a sua contribuição ao ex-prefeito De Santi.
Até aos 75 anos manuseou a sua “colher” de pedreiro que fez questão de levar em sua urna mortuário. De lá para cá perdendo gradativamente o brilho de seus olhos, já residindo na Av. Prudente de Morais, 1787, somente deu lugar para o trabalho de incentivo aos amigos e, em especial, aos de seus filhos. Jamais deixou de tomar conhecimento do que se passava por esta querida Araraquara. Ouvia rádio e TV e pedia para alguém ler notícias de jornais. Conversava com o Marcos sobre o dia-a-dia do trabalho da polícia. Entre outros programas de sua preferência estavam os noticiosos comandados pelo Datena e pelo Boris.
No encerramento do último ato de sua vida vestiu um terno branco, cercou-se de muitas flores carinhosamente oferecidas pelo Clube 22 de Agosto, FACIRA, ACIA, Santa Casa, Gota de Leite, SPC-SCVA, familiares e Rosmar. Cobriu seus pés com terra, para ele santa, que trouxe da Bahia. Recebeu o carinho de seus amigos e companheiros. No rol desses amigos acrescentou o Dr. Rafael Villani, Dr. José Ângelo, Dr. Eduardo Bonini, Dr. Wilson Aravequi, Dr. Jorge Zbeide, Dr. Gastão, Dra. Maria Silvia, Dra. Márcia, e outros profissionais da medicina. Levou, também, o carinho e a dedicação de todos os colaboradores do Hospital São Paulo, em especial da enfermagem. Brigava com as enfermeiras, inclusive com a Elizabeth, em um instante e, em ato contínuo, reconhecia o trabalho maravilhoso e humano que estes profissionais de enfermagem prestam.
Sempre teve uma palavra de incentivo aos funcionários do Buffet Maria Augusta e mesmo não enxergando conhecia todos pela voz.
Antes de deixar, materialmente, este mundo, sua alma já estava ao lado de nosso Pai, recebeu uma homenagem marcante, liderada pelo Sr. José Benedito e Sra. Maria Adélia (Quita), e todos os amigos que aqui deixara.
Obrigado pai pelo que você fez por todos nós. Sua liderança, sua fibra, perseverança, e a postura de um verdadeiro homem fez história e deixou um legado de honradez. Amanhã iremos formar a nossa família novamente. Você, ai, não está só, pois o Valter o esperou com o sorriso de filho, pedindo a Nossa Senhora, sua padroeira, que o guiasse nesta vida eterna. Aí não há casas a serem construídas com a sua colher de pedreiro, não há cabras e porcos a serem tratados, não há filmes de cowboy mas, com certeza, há amigos sinceros como aqueles que você conheceu na sua passagem por aqui.
” A morte, pai, não restringe: Transforma
Não aniquila: Renova
Não divorcia: Aproxima!
Hoje, pai, você é recordação
Hoje, pai, fica a saudade
Hoje, pai, ficam os seus ensinamentos
Hoje, pai, somos homens graça a sua lição de vida”.
(*) É o primogênito da família Anízia-Tobias.