Voltar a se feliz!

Padre Fernando Fraga

Fui criado com princípios morais comuns. Quando criança, ladrão tinha a aparência de ladrão e nossa única preocupação em relação à segurança, era a de que os “lanterninhas” dos cinemas nos expulsassem devido as batidas com os pés no chão, quando uma determinada música era tocada no início dos filmes, nas matinês de domingo. Mães, pais, professores, avós, tios, vizinhos, eram autoridade presumida, dignas de respeito e consideração. Quanto mais próximo ou mais velhos, mais afeto. Inimaginável era responder deseducadamente a policiais, mestres, aos mais idosos e autoridades. Confiávamos nos adultos, porque todos eram pais e mães de todas as crianças, da rua, do bairro, da cidade. Tínhamos medo apenas do escuro, de sapo, de filme de terror. Hoje me deu uma tristeza infinita por tudo que perdemos. Por tudo que meus filhos um dia temerão. Pelo medo no olhar de crianças, jovens, velhos e adultos. Matar os pais, os avós, violentar as crianças, seqüestrar, roubar, enganar, passar a perna, tudo virou banalidade de notícias policiais, esquecidas após o primeiro intervalo comercial. Agentes de trânsito multando infratores são explorados, funcionários de indústrias de multa, policiais em blitz são abuso de autoridade. Regalia em presídios são matéria votada em reuniões, direitos humanos para criminosos, deverão limitar-se para cidadãos honestos. Não levar vantagem é ser otário, pagar dívidas em dia é bancar o bobo, anistia para os caloteiros de plantão, ladrões de terno e gravata, assassinos com cara de anjo, pedófilos de cabelos brancos. O que aconteceu conosco? Professores surrados em sala de aula, comerciantes ameaçados por traficante, grades em nossas janelas e portas. Crianças morrendo de fome. Que valores são esses? Carros que valem mais que um abraço, filhos querendo-o como brinde por passarem de ano, celulares nas mochilas dos recém-nascidos. TV, DVD, Videogame, o que vai querer em troca desse abraço meu filho? Mais vale um Armani do que um diploma, mais vale um telão do que um papo, mais vale um baseado do que um sorvete. Que lares são esses? Jovens ausentes, pais ausentes, drogas presentes, e o presente uma droga. O que é aquilo? Uma árvore, uma galinha, uma estrela, uma flor. Quando foi que tudo sumiu, ou virou ridículo? Quando foi que esqueci o nome do meu vizinho, quando foi que olhei nos olhos de quem me pede roupa, comida e calçado sem sentir medo? Quando foi que me fechei? Quero de volta a minha dignidade, a minha paz. Quero de volta a lei e a ordem, a liberdade com segurança. Quero tirar as grades das minhas janelas para tocar as flores. Quero sentar na calçada e ter a porta aberta nas noites de verão. Quero a honestidade como motivo de orgulho, quero a retidão de caráter, a cara limpa, e o olho no olho. Quero a vergonha, a solidariedade, quero a esperança, alegria, teto para todos, comida na mesa, saúde a mil. Não quero lista de animais em extinção, não quero clone de gente, quero cópia das letras das músicas, cultura e ciência. Eu quero voltar a ser feliz, quero viver bastante, ter invenção de valores e ideais. Abaixo o “TER”, viva o “SER”. E viva o retorno da verdadeira vida, simples como uma gota de chuva, limpa como um céu de abril, leve como a brisa da manhã e determinantemente comum como eu. Adoro meu mundo simples e comum. Vamos voltar a ser gente, ter amor à solidariedade, à fraternidade como base, a indignação diante da falta de ética, de moral, de respeito? Discordar do absurdo, construir sempre um mundo melhor, mais justo e mais humano onde as pessoas respeitem as pessoas. Utopia? Não. Se você e eu fizermos nossa parte e contaminarmos mais pessoas, e essas pessoas contaminarem mais pessoas, heim! Quem sabe… (A.D.)

Boa semana a todos. (Padre Fernando Fraga)

Reflexão da semana

De tanto ver triunfar as nulidades, de tanto ver crescer as injustiças, de tanto ver agigantar-se os poderes nas mãos dos homens, o homem chega a desanimar-se da virtude, a rir-se da honra e a ter vergonha de ser honesto. (Rui Barbosa)

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