Reginaldo Galli (*)
Os jornalistas de rica plumagem que me perdoem, mas os plumitivos, estes vis novatos, também têm um coração. A deusa MÍDIA despeja sobre nós, minuto a minuto, dia e noite, de segunda a sexta, sábado, domingo e feriados de quebra, as mais atrozes cenas de guerra. Cada órgão da imprensa escrita, cada emissora de rádio e de TV parece estar participando de um concurso macabro, promovido pelo deus MARTE, o sanguinário, o inclemente, o desumano! Todavia, não bastassem as mentiras que as partes em litígio nos impingem, o que já é tradição, temos ainda de ver, ler e ouvir "especialistas em Economia", professores e doutores em especular, vaticinar, prognosticar e quejandos verbos que nos deixam no AR. Ou sem AR ?!
Já se cogita, pasmem, de quem pagará pelos custos do soerguimento do Iraque! Como é de sua envergadura moral e cívica, o generoso Presidente Bush pretende suportar sozinho os pesados encargos com a recuperação e administração dos poços de petróleo, desde que, democraticamente, dividam-se os demais prejuízos com todos os países-membros da ONU, ou seja, condôminos, inquilinos e serviçais do Edifício Planeta. Assim é justo, proclamam seus porta-vozes: fifty-fifty! Meio a meio!
Produção, cenários e atores tão modernos, mas que filme velhinho! O Eixo do Bem já transitou por aqui, de 1942 a 1945, e, em vez de pagar o prometido pedágio, recebemos brindes como prova da adesão à "política da boa-vizinhança": "jeeps" usados e "sobras de guerra". Eis a pura e dura verdade: o Brasil foi tungado antes, durante e depois da segunda grande conflagração universal. Lendo-se qualquer compêndio de História (idôneo, é claro) constataremos que, no balanço do conflito, éramos credores de seis bilhões de dólares (dez vezes mais, a valores de hoje)! Resumo da ópera (até o baixo-profundo entrou em depressão!): exportamos borracha, minérios, açúcar, vencemos a luta, cantamos o Hino Nacional e … perdemos a paz
Somente um poeta, e dos melhores, sob a carinhosa proteção das MUSAS, seria capaz de lavrar o registro anímico do que então ocorreu, ao vivo e sem cores…no escurinho…durante a permanência dos SAM BOYS nas bases aero-navais cedidas por nosso Governo e estrategicamente localizadas nordeste afora. Chamava-se MAURO MOTA esse pernambucano ilustre, testemunha presencial dos flertes, dos mimos, das promessas, dos namoros e… das seqüelas de tantas "conquistas". Pungente e cruel (afastem as crianças!), eis seu poema-protesto:
BOLETIM SENTIMENTAL DA GUERRA, NO RECIFE.
Meninas, tristes meninas,
de mão em mão hoje andais.
Sois autênticas heroínas
da guerra, sem ter rivais.
Lutastes na frente interna
com bravura e destemor.
À vitória aliada destes
O sangue do vosso amor.
Por recônditas feridas
Não ganhastes as medalhas
terminadas as batalhas
de glórias incompreendidas.
Éreis tão boas pequenas, o que é que fostes fazer ?
éreis pequenas tão boas !
De várias nuanças morenas,
ó filhas de Pernambuco,
da Paraíba e Alagoas.
Tínheis de quinze a vinte anos,
tipos de colegiais,
diante dos americanos,
dos garbosos oficiais,
do segundo time vasto
dos fuzileiros navais,
prontos a entregar a vida
para conseguir a paz,
varrer da face do mundo
regimes ditatoriais
e democratizar todas
as terras continentais,
a começar pelo sexo
das meninas nacionais.
……………………………………..
Quase que se rebentavam
vossos úteros infantis
quando veio o telegrama
da tomada de Paris.
Ingênuas meninas grávidas,
pra família não saber…
Apertai bem os vestidos
Que os indiscretos vizinhos
vos percam também de vista,
saístes do pediatra
para o ginecologista.
Meninas, tristes meninas,
vossos dramas recordai,
quando eles, no armistício,
vos disseram "good bye".
Ouvireis a vida toda
a ressonância do choro
dos vossos filhos sem pai.
Lindas jovens iraqueanas, o mundo não é tão mau. Dentro de dois ou três anos, vários caminhões da CAMPANHA PELA AJUDA HUMANITÁRIA irão procurá-las: entregar-lhes-ão guloseimas e presentes mil, tais como chicletes, batatinhas chips, catchup, refrigerantes, papinhas vitaminadas, chupetas anatômicas, fraldas descartáveis, enxovaizinhos. bonecas faladoras, trenzinhos que apitam, bichinhos de pelúcia e até bolas de futebol de verdade! Seus "babies" de olhinhos azuis conhecerão, afinal, a generosidade desta nossa magnífica civilização ocidental e … cristã!
e-mail: r.galli@uol.com.br