Prof. Sebastião Expedito Ignácio, docente e orientador de pesquisas do Curso de Pós Graduação em Linguística e Língua Portuguesa na Unesp, concedeu entrevista ao JA para falar de sua dedicação e amor ao trabalho.
Chama a atenção de pais, educadores e alunos para a construção de uma relação de ensino-aprendizagem saudável e com respeito mútuo.
Indicado por Sarah Coelho Silva ele é o destaque da semana em Gente. Confira a entrevista.
JA – Suas atividades de pesquisa estão voltadas também ao Ensino Fundamental e ao Ensino Médio?
Sebastião – Sim. A minha maior preocupação tem sido com o Ensino da Língua Portuguesa, principalmente em níveis que dão a formação básica para toda a vida.
JA – Na sua opinião, qual deve ser a prioridade: gramática ou produção de textos?
Sebastião – Sem dúvida, deve ser a produção de textos, sem todavia se descuidar da gramática.
JA – O senhor tem se dedicado à lexicografia. Em que consiste essa atividade e como tem sido desenvolvida?
Sebastião – A tarefa do lexiógrafo é, em suma, a de fazer dicionários. Mas antes de tudo ele tem de ser um teórico e um pesquisador incansável dos usos lingüísticos de sua época, principalmente da modalidade escrita.
JA – Existe algum grupo de lexicografia e lexicologia na cidade?
Sebastião – Sim. Ligado a uma universidade, Araraquara tem o grupo mais bem organizado do País, com o maior banco de dados informatizado. É o Centro de Estudos Lexicográficos e Lexicológicos da Faculdade de Letras da Unesp, fundado e sempre coordenado pelo Prof. Francisco da Silva Borba.
JA – O grupo tem desenvolvido muitos projetos de dicionário?
Sebastião – Já fizemos um Dicionário Gramatical de Verbos, publicado pela Editora da Unesp, um Dicionário de Usos do Português Contemporâneo, a ser publicado proximamente pela Editora Ática, além de outros projetos em andamento.
JA – Acredita que o dicionarista se sente um pouco “dono da língüa”?
Sebastião – Ao contrário, o dicionarista consciente sabe que a sua tarefa é tão-somente registrar a língüa em uso numa determinada época. Dona da língüa é o povo, é a sociedade que se utiliza dela para a comunicação eficaz. É essa própria sociedade que se encarrega de aceitar ou de repelir o que seja adequado ou inadequado.
JA – Quer dizer que a gramática e o ensino escolar devem aceitar a língüa que o povo fala?
Sebastião – A questão é que não existe apenas uma modalidade de língüa. Há muitas variantes devidas a fatores regionais, sociais, etc. E muitas dessas variantes não precisam ser ensinadas na escola. Tanto a gramática normativa quanto a escola têm de ter a sensibilidade e as bases científicas adequadas para selecionar o modelo que de fato deva ser objeto de ensino. Então, uma coisa é “aceitar” a língüa do povo, outra é privilegiar para o ensino a variante que seja mais adequada à recepção e à produção do saber, bem como à comunicação eficiente e eficaz.
JA – Por que o brasileiro lê pouco?
Sebastião – Porque não é incentivado, na escola, ao hábito da leitura, seja por prazer seja por necessidade; não aprende a ler no verdadeiro sentido do termo, ou seja, o de compreender a mensagem veiculada; e não tem poder aquisitivo para comprar livros.
JA – Até que ponto a leitura ajuda a produção de textos?
Sebastião – A leitura é fundamental para a aquisição não só do avervo cultural do indivíduo quanto para a assimilação das estruturas lingüísticas próprias da língua escrita. Mas essa leitura deve ser muito bem “aproveitada” no processo de ensino de redação, pois se não houver uma orientação adequada, o aluno reterá muito pouco das leituras que fizer.
JA – Qual o segredo para despertar o gosto pela leitura?
Sebastião – A conscientização de sua utilidade e a busca do prazer no ato de ler. O aluno só gostará de ler se isso lhe for agradável e se perceber que lhe será útil de alguma forma.
JA – Pela análise das redações de vestibular, costuma-se dizer que os jovens de hoje não sabem escrever. Isso é verdade?
Sebastião – Na verdade, se por um lado, o ensino da produção de textos é de modo geral muito precário, por outro lado, o jovem, na idade em que presta o exame vestibular, não tem, e nunca teve, a maturidade e o grau de conhecimento que querem tanto os organizadores dos concursos quanto os críticos e analistas.
JA – Como professor, o senhor poderia deixar uma mensagem?
Sebastião – Talvez eu possa aproveitar a oportunidade para fazer um apelo aos que representam os pilares dessa relação ensino-aprendizagem e da educação formal: à escola, pública ou particular, que não veja no aluno uma pessoa a ser adestrada ou um cliente a comprar um produto, mas sim um ser humano em formação que necessita de muita compreensão, muito afeto e orientação; que o professor saiba compreender para ser compreendido, saiba amar para ser amado, saiba respeitar para ser respeitado. Ao aluno, que não faça da escola um lugar de explosão de seus conflitos, mas um lugar pacífico onde possa crescer e se preparar para a vida. Aos pais, que não transfiram para a escola a responsabilidade que cabe à família.