Antonio Delfim Netto (*)
Pela primeira vez o governo fez o que já deveria ter feito há muito tempo: cortar despesas, em lugar de continuar simplesmente a depenar o contribuinte, Diante da perspectiva de não conseguir prorrogar a vigência da CPMF antes da data limite de 14 de junho, o governo ameaçou a sociedade com o aumento do Imposto sobre Operações Financeiras – o IOF. Significaria elevar ainda mais as taxas de juros que já estão em níveis insuportáveis. Na verdade as taxas subiram, só por conta do anúncio. Num instante de lucidez, o Executivo decidiu-se a também cortar as despesas.
O governo tem usado uma retórica equivocada na defesa da prorrogação da CPMF. O contribuinte fica muito feliz quando ouve a autoridade dizer que vai “perder” 400 milhões de reais de receita semanal. Ele já percebeu que, se alguém “perde”, tem alguém que está ganhando. Este alguém é ele, o contribuinte, que pelo menos durante algumas semanas estará com o dinheiro no bolso.
O brasileiro é hoje, com absoluta certeza, quem carrega nas costas a maior carga de impostos do universo. Os países que tem uma renda per capita semelhante à nossa, de 4 mil dólares/ano, têm uma carga tributária de 20% do PIB. No Brasil, o BNDES, que é um órgão do governo, acaba de confirmar que a carga tributária atingiu 35% do PIB. Mas, para calcular corretamente a dimensão da carga que pesa sobre a sociedade brasileira, é preciso acrescentar o déficit nominal das contas do governo, de 5% do PIB. Temos, então, um nível de tributação equivalente a 40% do Produto, o que significa que o trabalhador sua a camisa durante 12 meses e entrega ao governo, como imposto, o equivalente a quase 5 meses de salário!
Em 1994, quando se iniciou a atual administração, tínhamos uma carga tributária de 27% do PIB, que nos aproximava do nível praticado nos demais países. Ela cresceu 8 pontos percentuais, o que representa algo como 120 bilhões de reais a mais, por ano. O razoável seria um nível de tributação da ordem de 20%. Com os 5% do déficit chegaríamos a 25% do PIB, o que deixaria uma diferença de 15% no bolso dos brasileiros. Isso ajudaria o cidadão a cuidar melhor do emprego, de sua própria saúde ou da educação dos filhos.
Nessas circunstâncias, é quase inacreditável que autoridade venha a público dizer que o governo está tendo um enorme “prejuízo”, que está sendo “roubado” em 400 milhões de reais por semana com a interrupção da cobrança da CPMF! Outro absurdo foi tentar responsabilizar o Congresso pela demora em aprovar a prorrogação. A dificuldade não está no Congresso, mas no próprio governo que tardou em entregar o projeto. Ele foi aperfeiçoado na Câmara, aprovado em dois turnos de votação e está sendo examinado na Comissão de Constituição do Senado, onde seguirá o curso normal conforme garantiu o seu relator, senador Bernardo Cabral.
Se for mantido o projeto aprovado na Câmara dos Deputados, a CPFM terá a mesma alíquota de 0,38% até dezembro de 2003 e depois será reduzida para 0.08%. Diante da certeza que não poderá contar com a refeita da CPMF, nos níveis atuais, o próximo governo terá que empenhar-se seriamente para aprovar a reforma tributária no Congresso Nacional em 2003.
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