Na véspera da eleição, mexendo em minhas relíquias, abri um caderno de caligrafia de meus tempos de curso primário na década de 40. Dei uma folheada e encontrei uma caricatura feita por um tio meu numa das páginas. Recortei a caricatura e a estou publicando no canto esquerdo.
Meu avô do lado de Mamãe se chamava Manoel Lourenço e não teve nada a ver com meu faladíssimo Vô Manéco, pai de Meu Pai, cujo nome completo era Manoel Cândido da Costa.
Manoel Lourenço era português, da Província de Trás-Os-Montes, cujos nascidos se diz serem trasmontanos. Não cheguei a conhecê-lo. Mamãe me falava que o pai dela faleceu de pneumonia aos 34 anos, depois de ter tomado uma chuva fria nas costas ao voltar do campo. Certo dia, quando menino, saí brincando na chuva e Mamãe me alertou que eu já havia tido uma pneumonia aos 2 anos de idade e quase fui pros quiabos porque Fleming somente descobriu a Penicilina em 1939. Ela me disse que tomando chuva eu poderia "herdar" uma pneumonia igual à do pai dela.
Eu não liguei muito prá isto, mas fiquei curioso prá saber como seria a fisionomia do avô Manoel Lourenço. Sem entender direito essas coisas de tio paterno ou materno, perguntei a um tio paterno como era a cara do Manoel Lourenço. Evidentemente, ele não sabia dizer, porque não o conheceu, mas não perdeu o pique: pegou a caneta-tinteiro dele e desenhou a caricatura ao lado, explicando que aquele meu avô, sendo português, era igualzinho ao desenho que fez, porque português tem queixo largo, dentes compridos, testa curta e sobrancelha grossa. Acabando de desenhá-lo, ele bateu a caneta um monte de vezes na parte do cabelo, fazendo vários pontos e dizendo: "isto é caspa; todo português tem bastante caspa!..".
Esse desenho ficou em meu caderno de caligrafia todos esses anos. Hoje recortei tal desenho para apresentá-lo aos leitores, que poderão visualizar as linhas originais do caderno de caligrafia.
Eu não me pareço nada com esse avô português, apesar de ter o Lourenço no nome; eu me pareço com o Vô Manéco, mas herdei do outro a bandida da caspa.
Quando como uma comida mais forte, a caspa piora e me ataca até a sobrancelha. Para a sobrancelha, eu uso um creme medicamentoso que faz a caspa desaparecer de um dia pro outro. No cabelo, porém, já experimentei um monte de xampus que me foram recomendados pelos meus amigos R.K., J.R., S.B. e outros igualmente caspentos. No momento, estou usando um xampu a base de piritionato de zinco, que me garantiram ser eficaz.
Caspa é como menstruação: não é doença, mas é um incômodo que pode atingir homens ou mulheres, mesmo que estejam com saúde.
Em alguns estados nordestinos, quando a pessoa está com a pele descascando, em qualquer parte do corpo, eles também chamam caspa. Por aqui, a gente diz caspa apenas para as casquinhas brancas ou amarelas do couro da cabeça.
Em espanhol, a palavra também é "caspa", mas em italiano é bem diferente: "forfora". Em inglês, a palavra é esquisita: "dandruff". Nessas quatro línguas a palavra caspa é usada sempre no singular. Em francês, porém, a palavra caspa é usada sempre no plural: "pellicules". Além de "pellicules", eles costumam referir-se à caspa pela expressão "crase de la tête" (crase da cabeça). Por aí dá para perceber que eles odeiam a crase deles tanto quanto nós brasileiros odiamos e erramos nossa crase…
Aqui no interior do Estado, as mulheres que eu atendia no Serviço Especial de Saúde diziam caspa para referir-se àquele cascão seboso do alto da cabeça. Tenho anotado num caderno certas frases interessantes que ouvi durante os atendimentos. Um deles foi de uma jovem mãe que me disse exatamente assim: "Pois é, Doutor Guaracy, eu tinha medo de lavar a cabeça da nenê por causa da moleira, mas graças a Deus formou esse cascão firme e eu já não tenho mais medo de passar a mão na cabecinha dela…"
Como disse acima, tenho sempre ouvido as recomendações de meus amigos a respeito dos melhores xampus para combaterem a caspa, principalmente agora, que tenho de participar de audiências no fórum usando paletó e gravata, sendo que, se a caspa estiver atacada, a gente não pode vestir paletó azul marinho ou preto, senão é um vexame, ainda mais quando as testemunhas pisam na bola e a gente coça a cabeça…
Lembrando que meu tio disse a respeito da caspa de meu Avô Manoel Lourenço, eu andava doidinho para conhecer Portugal pela certeza de que lá eu encontraria xampus anti-caspa fantásticos.
Em 1993, realizei meu sonho de conhecer Portugal. Comecei meu passeio em Lisboa, onde entrei em várias farmácias, mas não encontrei nenhum xampu ou remédio para caspa diferente dos que temos aqui no Brasil. Dias depois, fui conhecer o "Shopping das Amoreiras", que era o mais novo e famoso de lá. Rodei o "shopping" inteiro e nada de especial encontrei para combater minhas crises de caspa.
Lá pelas tantas, num dos corredores até mais estreitos, dei com uma pequena loja de eletrônicos onde vi um cartaz anunciando: "Promoção MAQUININHA CONTRA A CASPA", com um preço em escudos até bem acessível. Fiz um ar vitorioso e contente e pedi ao atendente que me fizesse uma demonstração. Ele pegou a maquininha da vitrina, abriu-a, colocou 4 pilhas pequenas e pediu meu pente. Dei meu pente a ele, ele enfiou-o por uma abertura, apertou um botão e meu pente saiu do outro lado completamente limpinho da caspa que estava acumulada nele. Um sucesso, a maquininha contra a caspa!