Não atirar o pau no gato

Luiz Carlos Amorim (*)

Em uma crônica anterior, um tanto polêmica, falei das canções infantis tradicionais, aquelas que vem sendo cantadas por crianças de sucessivas gerações, o que me lembra outra crônica, mais polêmica ainda, sobre as fábulas, os contos de fadas importados e antigos que encantam nossas crianças.

O tema foi polêmico, porque mencionava as letras de canções como “Atirei o pau no gato”, “O Cravo brigou com a rosa” e outras mais, onde encontramos cenas de violência em cima de músicas gostosas e cadenciadas. Recebi muitas mensagens, de pessoas que concordavam, de outras que nunca tinham parado para pensar mas perceberam que realmente havia alguma coisa e de outras que achavam que era exagero.

Achei ótimo ter provocado uma discussão a respeito e essa discussão ter resultado em mudanças, que podem ser até localizadas, mas que já começaram a acontecer. E o melhor resultado disso foi uma matéria em um programa na TV a cabo, atingindo todo o país, sobre as inovações implantadas nas conhecidas canções infantis por professores e educadores aqui e Florianópolis. E o programa tem o poder de difundir a ideia, de disseminar a novidade.
A matéria mostrava educadores de crianças na pré-escola, cantando com seus alunos aquelas mesmas famosas canções infantis que tínhamos denunciado pelo conteúdo aparentemente inocente, embora tendendo à violência, mas com letra reescritas, repensadas.

Politicamente corretas, como disseram, termo que eu nem considero muito simpático, embora talvez seja apropriado.
“Atirei o pau no gato” ficou mais ou menos assim: “Não atirei o pau no gato / porque isso não se faz. / O gatinho é nosso amigo / Não devemos maltratar os animais / Jamais!”

E “O cravo brigou com a rosa…” está sendo cantado assim: “A rosa deu um remédio / e o cravo logo sarou / O cravo foi levantado / E a rosa o abraçou.” Não ficou melhor? Transmite uma mensagem positiva e a música continua gostosa e vibrante.

O “boi da cara preta” virou “boi do Piauí” e por aí vai. As crianças gostaram, pois perguntadas pela reportagem, disseram que preferiam as novas versões, como “não atire o pau no gato” e explicaram o porquê.

Uma doutora em educação, perguntada a respeito pela repórter, disse não concordar porque acha exagero pensar que as crianças possam ser influenciadas pelas letras das músicas. Eu peço licença para discordar, porque as próprias crianças já responderam a ela, crianças de dois, três, cinco anos.

Quando pediram a elas que justificassem porque preferiam as novas versões, responderam que não se deve maltratar nenhum animal, nenhum ser vivo, nunca. Então não é correto dizer que as crianças não prestam atenção ao conteúdo das letras. Elas entendem, sim, e até copiam. Elas são pequenos discos rígidos vazios que gravam tudo.

Melhor se pudermos passar-lhes boas mensagens, para que sejam adultos mais responsáveis amanhã.

(*) É Escritor, editor e revisor, cadeira 19 na Academia SulBrasileira de Letras, Fundador e presidente do Grupo Literário A ILHA, com 44 anos de trajetória. Http://luizcarlosamorim.blogspot.com.br

Foto Ilustrativa Freepik

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