Antonio Delfim Netto (*)
A tragédia argentina (e não estou me referindo ao futebol!) mostra claramente como são difíceis as negociações com o FMI. No momento em que o país precisa efetivamente do apoio do Fundo, quando sua economia se encontra numa situação em que é incapaz de sair pelas próprias forças, ele é submetido a uma humilhação monumental. Operando em nome do sistema financeiro internacional, o FMI quer obrigar a Argentina a pagar todas as suas dívidas, provavelmente sem nenhum desconto. Valendo-se da conjuntura política extremamente frágil, exigiu do Executivo e do Congresso argentinos a mudança da Lei de combate à sonegação, que previa severas sanções nos casos de fraude em operações financeiras.
Como se isso não fosse suficiente, a missão do Fundo está exigindo a manutenção do “curralito”, que é o nome que se dá ao bloqueio das contas bancárias de milhões de cidadãos argentinos! Alegam os técnicos do FMI (não sem alguma razão) que a liberação dos depósitos vai gerar mais inflação, mas é preciso olhar a outra face da moeda: a instituição do “curralito” empobreceu ainda mais a classe média argentina, de sorte que hoje metade da população está abaixo da linha da pobreza e 25% dos argentinos atingiram o nível da miserabilidade. Sustentar uma posição dessa natureza, chega ao limite da insanidade!
A lição que devemos tirar desses fatos é que não é uma boa coisa depender da ajuda externa. Em situações dramáticas, é preferível manter o FMI a uma saudável distância. Não é o caso de fazermos ilações precipitadas com a situação brasileira, que é complicada, mas não tem nenhuma semelhança com o que acontece na Argentina. E não tem, porque nos livramos a tempo da “âncora” cambial, apesar dos conselhos de alguns respeitados técnicos do Fundo. A flutuação cambial, o sistema de metas de inflação e o equilíbrio fiscal (ainda que precário), nos colocaram numa posição consideravelmente melhor. Não há nenhuma razão objetiva para acreditarmos na possibilidade de uma crise nos moldes argentinos.
O que é desagradável é assistirmos pessoas do próprio governo, importantes lideranças tucanas, estimulando essa crença na tentativa de fortalecer o seu candidato à Presidência. É uma atitude inútil (e insensata) porque o candidato governista tem um bom programa e tem suas próprias condições de vencer a eleição, ou perdê-la dignamente… Só produz intranqüilidade e provoca a instabilidade dos mercados, do que se aproveitam os especuladores financeiros. É uma idéia de jerico porque se as coisas se complicarem vai ficar evidente que isso não pode ter sido produzido por um governo que nem assumiu, mas sim por quem está no comando da economia há 10 anos…
E-mail: dep.delfimnetto@camara.gov.br