Fernanda Helene (*)
Reforma da Previdência, aposentadorias especias, reforma Agrária e renda
Uma das polêmicas geradas pela proposta da reforma da Previdência está associada às temidas perdas que a mudança promete no bolso do contribuinte. A consequência disso é; quem pode, corre atrás do prejuízo.
O Congresso Nacional concedeu neste ano pelo menos 46 aposentadorias especiais a parlamentares não eleitos em 2002, que variam aproximadamente de R$ 3 a R$ 12 mil.
Pelas normas que possibilitaram esses rendimentos, um congressista pode se aposentar, desde que tenha 50 anos, com oito anos de atividade dois mandatos para um deputado federal e um para senador – com o benefício proporcional ao tempo de contribuição.
Para citar exemplos – a Folha divulgou semana passada lista com 10 ex-senadores e 30 ex-deputados, ambos de partidos diversos – entre os que recebem valores brutos mais gordos estão o ex-deputado Cunha Bueno
(PP-SP) com R$12.720,00 e o ex-senador Francelino Pereira (PFL -MG) com R$ 8.342,32.
O discurso dos beneficiários das polêmicas aposentadorias especiais é quase unânime ao defender justiça para os direitos adquiridos. Como explicam alguns especialistas, benefícios criados pela Constituição de 1988 caíram como uma bomba na conta da Previdência, sem que houvesse a devida contribuição por parte dos beneficiados, o que resultou num senhor
rombo.
Ninguém quer ver seu padrão de vida diminuído, mas poucos privilegiados têm conseguido tal façanha. Vale dizer que, na proposta do governo Lula enviada ao Congresso, não há nenhuma referência à aposentadoria de parlamentares.
Para citar uma comparação do jornalista Clóvis Rossi, o governo está tratando a reforma da Previdência como “uma espécie de abre-te Sésamo da justiça social e do desenvolvimento sustentado”.
De outro lado, o Judiciário vem sendo a pedra no sapato do governo quando o assunto é reforma da Previdência. Àqueles não querem ver o leite derramado e tem poder de voz para pressionar este.
O ministro Maurício Corrêa, presidente do Supremo Tribunal Federal, comanda a pressão e tem se comportado como um verdadeiro líder.
Entre as principais exigências dos magistrados estão a aposentadoria integral e a paridade de reajuste entre ativos e inativos para não haver defasagem em relação ao salário. Consta que o presidente Lula já pediu à equipe do ministro da Previdência Ricardo Berzoini para fazer as contas.
Outro assunto que ocupou a imprensa nos últimos dias, motivada pelo episódio do boné, foi a não menos controvertida reforma Agrária. Historicamente, a população rural é a que mais sofre para obter renda; assentamentos têm-se revelado verdadeiras favelas do campo.
A tensão vem aumentando, pressionada pela falta de perspectiva dessa gente esquecida e pela atitude defensiva dos proprietários rurais que temem ver suas terras invadidas. A simples distribuição de lotes não resolve o problema e o governo sabe disso.
Planejamento e infra-estrutura é o que se espera nessa área tão prejudicada.
Ninguém discute; sobram demandas, falta dinheiro, e como falta. E vai faltar por muito tempo. Pelo menos é o que diz o relatório de 2003 da ONU. De acordo com os dados da instituição, a renda per capita no Brasil cresceu 0,8% em média, de 1975 a 2001, enquanto a média de crescimento dos países em desenvolvimento foi de 2,3 %.
Nesse ritmo, por uma questão matemática, o Brasil não deve atingir a meta de erradicar a miséria até 2015 – uma das oito nossas que constam da Declaração do Milênio, firmada por 189 países, em 2000.
Segundo o relatório, educação, longevidade e equidade de gênero (igualdade entre homens e mulheres) obtiveram resultados positivos no país. Entretanto, saneamento básico e acesso à água potável destacaram-se negativamente.
A má notícia não vem só de fonte internacional. Foi reportagem especial da revista Veja (2 de julho) que revelou uma queda de 15% na renda média do brasileiro e um aumento na taxa de desemprego nas principais cidades nos últimos doze meses.
A matéria se refere a todas as classes sociais, mas destaca a classe média, público alvo da revista, e segundo esta, dadas as proporções, a mais afetada.
O professor Joseph Stiglitz, da Universidade Columbia, em Nova York, e Prêmio Nobel de Economia em 2001 – em artigo recente sobre pobreza, globalização e crescimento – propôs uma atitude oportuna.
Na visão dele, o debate atual que gira em torno dos pontos positivos e negativos do crescimento econômico é equivocado; a pergunta, segundo o professor, deveria ser quais as políticas conduzem ao crescimento e se estas levariam ao tipo de desenvolvimento favorável aos mais pobres.
(*) É jornalista.