Antonio Delfim Netto (*)
Não é nenhum exagero comemorar o fato que a economia brasileira viveu em 2007 o seu melhor momento dos últimos vinte anos em matéria de crescimento e estabilidade. No balanço que apresentou à Nação em sua fala no rádio e TV dia 27 de dezembro o Presidente Lula festejou à sua maneira dizendo que finalmente parece que o Brasil aprendeu a fazer crescimento com inclusão social. O IBGE mostra que isso está acontecendo com os números do combate à pobreza (20 milhões de brasileiros ascendendo das classes D e E para a classe C, desde 2002) e de queda do desemprego para o nível de 8.2% , o mais baixo desde que o índice foi criado. Dois milhões de novos empregos foram criados, registrando um aumento de 7% da massa salarial.
Como sói acontecer, uma boa parte da "grande" mídia tratou com a habitual ligeireza esses resultados como se eles não representassem grande coisa. A mesma que dedicaram ao seu conteúdo global, alías notável pela civilidade e concisão, sem nenhum desperdício retórico nos seus 9 exatos minutos em que ocupou a atenção dos ouvintes. Além da densidade, a forma com que apresentou o balanço deve servir de padrão para seus sucessores. É verdade que o Presidente Lula decepcionou a oposição, aceitando respeitosamente a decisão do Congresso extinguindo o imposto do cheque (criado, aliás, quando a atual oposição era governo). Sua postura deu uma extraordinária contribuição ao fortalecimento das instituições republicanas entre nós.
Além do fato inédito de poder comemorar uma redução importante do desemprego, desde muitos anos, o Presidente assumiu com todas as letras, ao referir-se ao PAC, uma opção de governo para recuperar o planejamento estratégico que foi abandonado nos últimos vinte anos: "as décadas perdidas (para o crescimento) pela falta de confiança e pela falta de planejamento e ação do Estado ficaram para trás" disse ele.
A renovação da crença que entramos numa etapa de crescimento firme é claramente mensurável pelas pesquisas em todas as classes sociais: é dominante entre assalariados, cresce entre empresários e ganha terreno até mesmo em certos extratos das chamadas classes médias que se julgam mais "intelectualizadas", dominadas pelo preconceito em relação ao fato de serem governadas por um ex-torneiro-mecânico de poucas letras… Como o desenvolvimento depende em boa parte do estado de espírito das pessoas e do despertar do espírito selvagem (o "animal spirit") dos empresários, estamos em bom caminho, mas… o que falta?
Falta realizar plenamente aquela opção, em primeiro lugar não retardando mais as ações de uma política industrial-exportadora, para garantir: 1.a geração de empregos capazes de absorver a mão-de-obra que nos próximos anos será liberada das atividades agro-pastorís e minero-metalúrgicas, em razão do aumento da produtividade que as inovações tecnológicas estão rapidamente impondo a esses setores e 2.a renovação do ânimo (em baixa, atualmente) dos empresários industriais para que retomem os investimentos direcionados ao aumento das exportações, sem o que voltaremos a conviver com os constrangimentos externos que sempre travaram o desenvolvimento brasileiro, na eventualidade de perturbações que já estão visíveis no comportamento dos mercados financeiros e no comércio globais.
Isso dará ao governo a oportunidade de montar toda uma estratégia que oriente as ações estatais de suporte aos setores privados que em última análise são os responsáveis pelo desenvolvimento. O governo Lula sabe o que fazer: o ministro Miguel Jorge tem pronto um conjunto de ações para implantar uma política industrial-exportadora que terá função decisiva na sustentação do crescimento brasileiro.
(*) Professor Emérito da FEA-USP , ex-ministro da Fazenda, da Agricultura e do Planejamento.
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