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Empobrecimento acelerado

Sem trabalho, advogado perda e auto-estima e passa a fazer serviços menos nobres. A OAB batalha para ampliar o mercado de trabalho e melhorar a qualidade do ensino jurídico.

Eunice Nunes

Ligia Samanta Pirutti Salvador é uma advogada de 27 anos, formada em 2000 e inscrita nos quadros da seccional paulista da OAB em 2001. Nessa época, cheia de sonhos, Ligia só queria advogar e crescer profissionalmente. Dois anos depois, os sonhos se foram e Ligia se pergunta se fez o caminho certo.

Como ela, há milhares de advogados. Pior, há milhares de bacharéis que nem advogados conseguem tornar-se. O índice de reprovação no Exame da OAB fica por volta dos 80%. E nos concursos para magistratura e Ministério Público, a aprovação tem sido na faixa dos 2%, índice que não permite sequer preencher as vagas existentes.

A história de Ligia ilustra bem a realidade: “Dediquei cinco anos de minha vida ao curso de Direito, paguei caro por ele, batalhei e passei no Exame de Ordem, mas não consigo trabalho. Sem trabalho, não posso fazer curso de inglês nem cursos de aperfeiçoamento. Acho um absurdo que escritórios e empresas só queiram advogados inexperientes para fazer serviço de boy e não se preocupem em dar oportunidade para que aprendam a advogar. Recebemos salários de fome, que não dão nem para pagar a OAB, a AASP, plano de saúde e tudo mais que um profissional precisa, que dirá pagar dívidas e comprar livros”.

Ligias não faltam por aí, histórias vivas das dificuldades da classe, resultado, em grande parte, do excessivo número de cursos de Direito que foram surgindo na década de 70 e pipocaram por todo o país na década de 90.

A oferta excessiva de mão-de-obra resulta em aviltamento de honorários. E honorários baixos significam empobrecimento. Empobrecimento esse que faz com que o advogado se diminua, perca a sua auto-estima, faça serviços menos nobres e, às vezes, deixe de ter um comportamento ético adequado. Ingredientes para o desprestígio da classe, porque o mau advogado prejudica a sociedade em cadeia e a sociedade passa a desconfiar e a falar mal de todos os advogados.

Contribui para piorar o quadro, a própria crise econômica que atingiu duramente a classe média, que é de onde vem a maior parte da clientela da advocacia.

Mas não é só. Sem trabalho, os advogados não conseguem pagar a anuidade da Ordem. Cerca de 30% estão inadimplentes. Acorrem ao Convênio de Assistência Judiciária como salvação da lavoura. São quase 40 mil inscritos. Num universo total de 200 mil advogados paulistas, dos quais 60% são ativos, um terço milita na Assistência Jurídica. Destes, aproximadamente 24 mil vivem exclusivamente da Assistência Judiciária, com uma remuneração média de R$ 700, informa Miguel Malufe Neto, presidente da Comissão de Assistência Judiciária.

A.S., de Presidente Prudente, é um deles. Vive com cerca de R$ 500 mensais de seu trabalho na Assistência Judiciária. “A situação está dura. É muito difícil arrumar um cliente. Então, dependo do convênio para sobreviver. Isso porque moro numa cidade do interior, se não, estaria perdido”, declara, pedindo para não ser identificado.

A comissão processa 70 mil certidões por mês. Cada uma corresponde a um serviço prestado e a uma remuneração, ou seja, são 70 mil pagamentos de honorários. A tabela de honorários é reajustada anualmente de acordo com a inflação.

“É preciso recompor a tabela de honorários do convênio de Assistência Judiciária a níveis compatíveis com a advocacia. A Ordem tem pleiteado aumentos, mas o governo estadual alega que está em regime de contenção de gastos”, informa Valter Uzzo, secretário-geral da OAB SP.

O que o mercado quer

Rodrigo Forte, responsável pela seleção na área jurídico-fiscal da Michael Page, empresa inglesa especializada em recrutamento de profissionais, confirma que o mercado está difícil. “Há muitos advogados no mercado e poucas vagas. Os grandes escritórios de advocacia empresarial estão reduzindo sua estrutura, pois acabaram as fusões, privatizações, aquisições, e eles precisam se readaptar a uma nova realidade de mercado”, afirma.

Forte informa que recebe cerca de 80 novos currículos de advogados a cada dia. Requisito essencial é o inglês fluente, sendo desejável também o espanhol.

No caso de advogados recém-formados, “usamos o ranking da OAB como parâmetro e só selecionamos os que cursaram escolas de primeira linha. Essa é uma exigência do empregador”, declara Forte.

Para os advogados mais experientes, a faculdade não é um fator tão determinante. “O que se espera de um profissional com experiência é uma carreira consistente, que demonstre sempre a busca pelo aperfeiçoamento. Uma estadia no exterior é desejável”, informa.

Para sair da vala comum, o advogado deve especializar-se, pois quem faz tudo, não faz nada muito bem. Um bom instrumento é a Escola Superior de Advocacia da OAB SP, que passou a oferecer também cursos à distância.

Para atenuar o problema, a OAB SP tem procurado ampliar o mercado de trabalho dos advogados e melhorar os honorários. Exemplo recente é o convênio assinado com a Prefeitura de São Paulo para dar atendimento judiciário gratuito a comunidades e grupos sociais carentes da capital. Nesta nova frente de trabalho, o advogado prestará consultoria jurídica extrajudicial. Quando for o caso, promoverá também ações judiciais.

A Seccional paulista tem empreendido estudos para a implantação de uma assistência jurídica integral, que envolve toda a assistência de que o cidadão possa precisar, quer antes, durante, ou depois de algum processo judicial.

Além destas ações, a Ordem tem proposto que se torne obrigatória a presença do advogado em escrituras, em todos os contratos e demais atos idênticos do registro público. Da mesma forma, tem lutado para que o advogado tenha presença obrigatória nos Juizados Especiais, nas Comissões de Conciliação Prévia e nos tribunais de arbitragem.

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