Paulo Celso Biasioli (*)
Araraquarenses das décadas de 50 e 60, com certeza, se lembram de um grupo de amigos cujo relacionamento, companheirismo e fidelidade perduraram por mais ou menos 40 anos, porém muito pouco se falou ou registrou sobre ele. Seu nome, além de criativo, era auto explicativo: “APERITIVO ROTATIVO”.
Era um grupo de profissionais de ramos heterogêneos, com espíritos alinhados e dirigidos ao mais alto e puro grau de respeito e companheirismo, totalmente informal, sem cerimonias e protocolos, mas, acredite, organizado. Sem qualquer tipo de estatuto, registro oficial e outras necessidades legais, este inesquecível grupo sobreviveu quase que imutável e com o mesmo espírito por cerca de 4 décadas.
O esquema era muito simples e funcionava mais ou menos assim: “todos os domingos, às 11 horas da manhã, se reuniam na casa de algum membro, pré escolhido e em seqüência quase imutável, para uns comes e bebes, sem qualquer tipo de pompa”, apenas para se encontrarem e comentarem amistosamente as coisas da Araraquara tão querida por todos. Com o passar dos tempos, os encontros mudaram-se para as noites das quintas-feiras. O compromisso era rigorosamente respeitado e ansiosamente esperado; só por um motivo muito forte alguém faltava. Invariavelmente apareciam convidados ou parentes que eram citados em ata, como “pingentes”.
Me lembro de alguns dos participantes, algumas realizações e passagens interessantes que vão, por não terem sido preservadas, sendo esquecidas com o tempo, como é próprio e natural do brasileiro.
Como eu era um garoto e era respeitoso se dirigir aos mais velhos como “Seu”, relembro alguns nomes: “Seu Bota” (da Casa Barbieri), que era “presidente” – sem ser eleito, mas por respeito – e tinha uma voz rouca, quase apagada, mas liderança e presença destacadas. “Seu Ladeira”, que era uma espécie de secretário e tinha a missão de redigir, em livros pretos, a ata das reuniões, sempre lidas na abertura do encontro posterior. Elas eram muito engraçadas, pois sempre relatavam, de forma bem humorada, elogios ao casal anfitrião, gozações ou “pisadas” de alguém. Elas são preciosas obras históricas, cuja caligrafia, lembro-me bem, pareciam letras bordadas. Não sei onde estes livros se encontram. Uma pena! Bem que meu irmão Renato tentou resgatá-los.
Outros membros eram meu amado e saudoso pai Pilade Biasioli, Seu Dindin (Garita), Seu Sebastião (que era vizinho do seu Bota), Dr. Mazzi, Seu Lopes (da Casa Brasil), Seu Bizelli (era o “bom gosto” da turma), Seu Domingos Ferrari (da gráfica), Dr. Nelson Gulo, Dr. Zaniolo (pai do Oswaldo), Seu Primitivo Rodrigues, Seu Maia (de quem menos me lembro). Eles foram os fundadores. Se esqueci alguém, perdão.
O grupo sempre foi constituído por volta de 11 ou 12 membros. Por falecimento ou mudança de cidade, após algum tempo, entraram os “novatos”: meu sogro Manoel Marques, Seu Orlando Luzia, Seu Américo Estela, Dr. Nicolino…
Eventualmente, em épocas especiais, as famílias se reuniam em churrascos ou festas inesquecíveis, sempre animadas com músicas de Dona Luiza (do Didim) e Dona Marize (do Nelson). A “Turma do Aperitivo” chegou a promover eventos beneficentes que marcaram época na cidade: o Baile Junino “Uma Noite ao Pé do Fogo”, foi apenas um deles. Eu era pequeno, mas me lembro de um acontecimento realizado no antigo e charmoso Teatro Municipal (“que estava para ruir” – frase de Rômulo Lupo), que foi bem decorado e muito concorrido. Meu pai chegou a filmar em 8 mm, numa primitiva máquina “a corda” alguns dos encontros e eventos. Os filmes, infelizmente, não sei onde estão. Estou à procura, pois os considero verdadeiras relíquias da história contemporânea da cidade.
Infelizmente não houve sucessão e a vida pouco a pouco foi chegando ao fim para cada um deles e com isso o “Aperitivo” acabou…
Não sei se hoje seria possível formar um grupo com aquele modelo, afinal não temos mais tempo para os amigos, é mais confortável ver a novela, contado coisas de um mundo que raramente é o nosso; ver um futebol suspeito na qualidade e no comportamento ou navegar pela Internet que (por paradoxo) é o máximo da INDIVIDUALIDADE GLOBALIZADA.
(*) leitor do JA pelo site www.ja.leiaonline.com.br