Presentes Inesquecíveis

Andei entrevistando alguns colegas médicos antigos como eu a respeito de presentes que receberam de clientes em sinal de agradecimento. Eles me disseram que gostavam de ganhar presentes simples e que presentes complicados eram os que davam problema, como ganhar um perfume exatamente do gosto dele, uma camisa exatamente do número dele ou da cor predileta, coisas assim.

Da minha parte, entendo como presente complicado aquele que o obriga a tomar determinadas providências. Em julho de 1965, operei um menino de Matão que tinha um defeito no pipi e o pai, extremamente contente, me prometeu um "porquinho". No dia seguinte, ele me deixou na portaria do prédio um engradado com um enorme porco vivo. O porteiro me ficou fazendo pressão e eu precisei interromper uma consulta para ligar prá meu amigo Manoel Francisco Gregório Filho, que veio com uma caminhonete buscar meu presente. Em seguida, eu consegui negociar o suíno com meu saudoso amigo Natal Arnosti, que ficou com o porco e me deu em troca um leitão morto, temperado e assado no dia de meu aniversário, que foi no mês seguinte.

No ano de 1980, uma de minhas filhas foi passar um ano nos Estados Unidos, como intercambiada do Rotary Club. Na primeira semana, ela foi recepcionada numa reunião do Rotary de Canton, Estado de Ohio, onde um dos presentes lhe perguntou qual era o dinheiro do Brasil. Ela respondeu: "cruzeiro". Aí ele perguntou o que se poderia comprar com 1 cruzeiro. Ela pensou, pensou e ficou sem saber responder porque, com a inflação, a entrada do cinema estava custando dois mil cruzeiros… Tanto foi que, pouco tempo depois, durante o governo do Presidente José Sarney, nosso dinheiro passou a ser o CRUZADO, sendo um cruzado igual a mil cruzeiros.

Naquela noite, ela me telefonou chorando e eu disse prá ela: "Se perguntarem de novo, responda: "Just a candy" ("apenas uma bala!").

Naquele mesmo ano de 1980, mês de junho, eu operei uma menina de 8 anos, que me foi encaminhada por um médico de Santa Cruz do Rio Pardo porque havia sofrido graves queimaduras numa explosão simultânea de vários busca-pés. Internei-a na Santa Casa local e a operei com extensos enxertos desde o peito e as costas até aos quadris. Ao dar alta pra menina, o pai dela, homem muito simples, veio ao meu consultório e colocou uma nota de UM CRUZEIRO novinha em cima de minha escrivaninha. Ele me disse exatamente assim: "Doutor, eu sei que o Governo já pagou o Senhor pela operação da minha filha, mas eu não posso voltar prá casa sem dar esse presentinho pro Senhor; esta nota é novinha, em sinal de agradecimento!…"

No dia seguinte, liguei prá minha filha lá nos Estados Unidos e disse prá ela ampliar a frase que eu havia dito prá ela. Ao invés de dizer apenas "Just a candy", era prá ela responder: "Just a candy, but sometimes a plastic surgery" (Um cruzeiro dá prá comprar uma bala, mas às vezes dá prá pagar uma cirurgia plástica…")

Aí no canto esquerdo está uma foto daquele 1 cruzeiro que ganhei de presente do homem e que tenho guardado até hoje entre minhas preciosidades.

Como eu ganhava muitos presentes, os médicos que tinham consultório perto do meu tinham uma certa dor de cotovelo. Certo dia, eu comprei uma geladeirinha tipo "frigo bar", para colocar em meu consultório. Era uma quinta-feira, ali pelas 17 horas quando a loja fez a entrega e, estando no meio de uma consulta, mandei colocar o engradado no corredor, bem em frente da minha porta. No intervalo, peguei um papel de carta e escrevi, imitando letra feminina: "Querido Doutor Guaracy, estou encantada com a operação dos meus seios, aceite este pequeno presente em sinal de gratidão". Colei o papel no engradado e deixei-o ali no corredor até às sete da noite. As secretárias me disseram que os outros médicos ficaram comentando que eu era um sortudo, que até geladeira eu ganhava…

Todos os sábados, tenho participado do programa "Dicas de Saúde", da Rádio Cultura, às 15 pro meio-dia, para homenagear algum médico da cidade, num quadro intitulado "Obrigado Doutor". No sábado passado, dia 18, homenageei o Patologista Dr. Mário Paíno e, no ato, contei sobre um estranho presente que ele ganhou há alguns anos. Entregaram-lhe uma caixa grande, empacotada, em cujo papel havia alguns pequenos furos. Ao abrir, foi surpreendido com o presente que era, nada mais nada menos, que um robusto galo índio que logo saltou da caixa promovendo um corre-corre no laboratório até que foi recolocado no engradado. Ele levou o galo prá casa e, no dia seguinte, pediu a um vizinho carpinteiro que construísse um galinheiro no quintal, porque a filharada havia gostado do presente. Nova surpresa: o galo começou a ficar cada dia mais triste e nem cantava até que um irmão dele, ao visitá-lo, atinou com a causa e despachou para o Dr. Paíno 10 galinhas, que transformaram o galo índio num dos melhores cantores matinais do bairro…

Não vou ficar atrás, porque um frango que ganhei foi muito mais surpreendente… Operei uma senhora de Boa Esperança do Sul, no final da década de oitenta. No dia de tirar os pontos, ela entrou no consultório com um frango pendurado na mão e chorando copiosamente. Custou para ela conseguir explicar que me havia trazido o frango de presente e que, ao desembarcar do fusca, o saquinho de papel rasgou, o galo caiu e ela, sem querer, pisou na perna esquerda do frango causando uma fratura.

Antes de atender a mulher, que ainda chorava, tratei de atender o frango. Corrigi a fratura da perna dele, coloquei duas tabuínhas daquelas de olhar a garganta e enfaixei. Mostrei prá mulher que estava tudo bem e coloquei o frango espremidinho atrás do pedestal da pia do meu banheiro para que ele ficasse imóvel. Tirei os pontos da mulher e agradeci o presente.

Ali pelas sete da noite, terminei as consultas e fui prá casa. À meia-noite passada, eu me lembrei do frango e corri até o consultório para buscar o coitado, que deveria estar com uma sede danada. Para minha enorme surpresa, ao lado do frango estava um ovo. Não era frango, era uma franga que, em sinal de agradecimento pelo meu trabalho "ortopédico", me havia dado aquele que deveria ser seu primeiro ovo de presente prá mim…

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