Passam os dias depois daquela tragédia, aquele corte na vida onde tudo é ferida, onde nada tem sentido nem sequer é ouvido ou discutido nem entendido porque quando a saúde se afasta nada basta nem se descobre o porquê ficamos num mundo desconhecido, como que iludido. É como estar não estando… Tudo é hospital e socorro, tomam-se injeções e remédios numa infinidade total e estranha. A vida fica fria, desiludida quase morte e quase vida, há pesadelos e descontroles. A gente acha que é, mas, não é. Tudo é estranho, esquisito muito feio nada bonito. As pessoas que nos cercam dizem coisas que nem sequer entendemos. Não por não querer entender, mas, por estar fora da órbita: descontrolado, dopado, indiferente ao dia-a-dia da nossa existência. Tudo é confuso, obtuso, estranho e sem o mínimo sentido de vida. Tive pesadelos horríveis, cai da cama a mais de dois metros de altura e voltei machucado. E, sem saber, falava com os enfermeiros e enfermeiras pedindo pra que me soltassem daquelas cordas que me amarravam. Mais parecia um pesadelo do qual, pelo meu próprio benefício, não poderiam me tirar enquanto estivesse naquele estado mórbido.
De repente, você dorme um pouco e esquece que está amarrado. Quando acorda é como se o pesadelo voltasse, com mais violência. Foi muita encrenca junta e seu corpo fica à disposição de muitos enfermeiros e enfermeiras que cotucam você, sem a mínima complascência. Injeções na barriga, na bunda, nos braços, nas veias de todo corpo exposto às ordens dos médicos que tentam lhe salvar da água nos pulmões, do disparo do coração e da pneumonia que arde.
Agora tudo é passado, já foi… acabou, longe do hospital e dos enfermeiros. Das injeções e retoma-se a tranqüilidade, o pensamento começa a se manifestar ordenadamente, as coisas boas que passamos ficam na mente e no ar. Quanta coisa boa, quantas vibrações e alegrias, quanta fantasia vivida, extremamente vividas nos bons tempos: por exemplo, os amores. Tinha quase tudo às mãos, era só pensar, pegar e viver intensamente aquilo que era tão bom. Quanta saudade traz, quanta alegria e, também, quanta tristeza infundada. Mulheres nem sei quantas tive, foram centenas: brancas, loiras, japas, morenas, mais que morenas e sempre maduras. Quantos romances foram engajados na minha vida, um sem fim deles. Todos deliciosos, um melhor que o outro. Pequenas decepções que em nada trava o valor das emoções. Agora o pensamento começa a se libertar e correr em busca do bom que passou, mas, deixou saudade nesta nova vida. O bom mesmo é recordar cada uma das coisas boas que passaram pela nossa vida…