Artur Quaresma Filho (*)
O anteprojeto de lei para aperfeiçoar a aquisição de bens e serviços pelo governo, disponibilizada pelo Ministério da Fazenda na Internet (www.comprasnet.gov.br), traz um ponto que se constitui numa brecha inadmissível que, se não for fechada, comprometerá irremediavelmente a intenção do governo de aperfeiçoar as licitações.
Como ponto positivo, baseado em outro compromisso assumido assim como foi a consulta pública, destaca-se que a lei resultante não se aplicará à contratação de obras e serviços de engenharia. É uma decisão bastante correta, pois a quase totalidade dos procedimentos licitatórios nesta área está satisfatoriamente contemplada na Lei 8.666 (Lei de Licitações e Contratos).
Entretanto, a proposta cria novas modalidades de licitação. Uma delas, a Convocação Geral, é definida como “procedimento de contratação em que é necessária aferição mais detida da qualificação dos interessados ou do atendimento das especificações do objeto”. Segundo o anteprojeto, a Convocação Geral poderá ser aplicada, entre outros, à “concessão e permissão de obras e serviços públicos” e “sempre que a Administração repute conveniente”.
Trata-se de um retrocesso porque, se a lei estivesse em vigor, o administrador público federal poderia interpretar que, na concessão de obras públicas, como por exemplo rodovias federais e estações de saneamento básico, seriam permitidos procedimentos licitatórios vedados na Lei 8.666: exigência de qualificação técnica da empresa por serviços anteriormente executados e subjetivismo na escolha da proposta vencedora, ambos admitidos pelo anteprojeto ora em debate. As concorrências para essas obras poderiam ser conquistadas somente pelas empresas que já atuam no mercado há muitos anos, favorecendo as que caírem nas graças da comissão julgadora e não as que apresentarem objetivamente as melhores condições de execução da obra licitada.
Esse ponto da proposta constitui uma brecha inadmissível que, se não for fechada, comprometerá irremediavelmente a intenção do governo de aperfeiçoar as licitações. Uma vez que certamente esta não foi a intenção do governo, urge modificar o anteprojeto, retirando as obras públicas da Convocação Geral. E é imprescindível eliminar a possiblidade de a Administração aplicar essa nova modalidade de licitação “sempre que julgar conveniente”.
De outra parte, o anteprojeto contém um avanço. Dispõe que, em todas as licitações para aquisição de bens e serviços, “deve ser sempre admitida a participação das empresas em consórcios”. Se esta regra valesse para as concorrências de obras públicas, a disputa incluiria ainda mais construtoras, com benefícios em termos de preço e qualidade para Estado e sociedade.
Para introduzir esta modificação, porém, os administradores públicos da União, dos Estados e dos Municípios, nas instâncias do Executivo, Legislativo e Judiciário, não precisam aguardar uma futura modificação da Lei 8.666. Basta estipular desde já, nos editais das concorrências de obras públicas, que será aceita a formação de consórcios.
A nova Lei abrangerá a administração direta e a administração indireta, compreendidas as autarquias; fundações criadas ou mantidas com recursos estatais, com personalidade de direito público ou privado; empresas públicas e sociedades de economia mista prestadoras de serviços públicos; empresas públicas e sociedades de economia mista exploradoras de atividades econômicas, incluindo suas subsidiárias.
(*) É presidente do SindusCon-SP Sindicato da Indústria da Construção Civil do Estado de São Paulo e coordenador da Comissão da Indústria da Construção da Fiesp.