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A anistia na véspera do Natal

Tenente Dirceu Cardoso Gonçalves (*)

Ainda não foi nesta semana (24 a 29) o desentranhamento da Anistia aos envolvidos nos acontecimentos de 8 de janeiro de 2023 e nem da revogação do foro privilegiado de senadores e deputados, que os parlamentares da oposição – constituídos em maioria – acordaram com o presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Motta, colocar em votação. A quarta e quintas-feiras foram de insatisfação, com os oposicionistas cobrando pela entrada das matérias na pauta e os governistas lutando para isso não acontecer. Ao final do período, depois de uma série de justificativas, saias justas e desaforos, o presidente anunciou, em tom de promessa, que colocará a anistia em votação na sessão de 23 de dezembro, antevéspera do Natal e última reunião antes do recesso parlamentar de fim-de-ano, que se estenderá até o começo de fevereiro. A oposição insiste que a votação seja antes, de preferência no dia 11.

Há muitas justificativas para a dificuldade de votação da anistia. A principal delas é o desejo dos governistas – e também dos seus amigos do Judiciário – de manter o ex-presidente Jair Bolsonaro alijado das eleições de 2026, para que isso possa ampliar as possibilidades de reeleição de Lula, que, se vencer, partirá para o quarto mandato presidencial. O que encheu a oposição de esperança é o desacerto entre os presidentes Motta (da Câmara) e Davi Alcolumbre (do Senado) com o presidente Lula. Quando ambos se distanciaram do governo, sobrou espaço para os bolsonaristas e direitistas negociarem o andamento das matérias represadas. Mas ainda permanecem obstáculos a serem vencidos.

Outro grande problema é a condenação de Jair Bolsonaro e assessores – principalmente pelo fato de terem sido julgados pelo STF quando deveriam ter suas questões apreciadas em primeira instância e passada pela segunda, terceira e tribunais superiores em grau de recurso, conforme o estabelecido no instituto do devido processo legal. Importantes segmentos do Direito brasileiro afirmam que o julgamento de Bolsonaro, ministros e dos demais envolvidos no 8 de janeiro é nulo por ter ocorrido com rito invertido e sem possibilitar a defesa dos réus. Lembram ainda que a condenação do grupo será analisada pela segunda turma do STF.

A revogação do foro privilegiado que, em vez de favorecer os parlamentares, na prática os colocou ao alcance dos ministros da suprema corte é esperada; quando ocorrer, o Judiciário voltará a ter de pedir autorização ao Legislativo quando pretender agir contra qualquer dos congressistas. Só poderão investigá-los ou processá-los e condená-los mediante autorização da casa legislativa onde cumprem seus mandatos. Daí a proposta de eliminar o instituto que, em vez de fortalecer, enfraquece a classe.

A anistia interessa pelo menos a 1,4 mil pessoas encarceradas na tarde e noite de 8 de janeiro, após a depredação do Paládio do Planalto, Congresso Nacional e Supremo Tribunal Federal. Somam-se a eles os arrastados em 9 de janeiro no acampamento à frente do quartel-general do Exército e os membros do governo Bolsonaro condenados pelo STF. O número de interessados na matéria é variável, visto que alguns foram condenados, outros fugiram do País e alguns morreram. No dia 25 de março último, o número de condenados pelo STF passava dos 500 réus. Em agosto somavam 643. Em setembro, 141 presos continuavam em regime fechado, enquanto 44 estavam em prisão. Além dos condenados, há ainda centenas de investigados e réus que aguardam julgamento.

Anistia é o perdão oficial a quem cometeu crimes com motivação política principalmente. O inusitado desse momento é que os atuais processados e condenados por crimes de menor potencial e sem a produção de mortes. Mesmo assim, são fortemente perseguidos pelos governistas, onde se acomodam os remanescentes da anistia de 1979, compostos por sequestradores, assaltantes de bancos e até cometedores dos chamados crimes de sangue.

Além das discussões locais sobre conceder ou não o perdão aos participantes de 8 de janeiro de 2023, ainda temos o questionamento do presidente Donald Trump e do governo dos Estados Unidos, que atua em favor de Jair Bolsonaro. Espera-se que o Congresso Nacional, a casa competente para decidir sobre a questão tenha todo o equilíbrio para fazer da anistia instrumento de paz nacional, conce3dendo-a ou não aos envolvidos, mas fazendo-o diante de razões irrefutáveis. Se permanecerem dúvidas, a paz dificilmente será alcançada…

(*) É dirigente da ASPOMIL (Associação de Assist. Social dos Policiais Militares de São Paulo)

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