Vera Botta (*)
Vidas se vão, desafios ficam.
De quantas lutas é feita a vida de um guerreiro? De incontáveis. Falo de Luis Alberto Marim Jr., Luisinho, nosso batalhador incansável dos direitos dos portadores de necessidades especiais. Amigo, irmão, cidadão de nossa terra.
Morreu no último final de semana. Insondáveis atalhos da vida! Incompreensíveis, muitas vezes, os chamados da vontade divina. Um sentimento de dor, de perda tomou conta de todos nós. Na última sessão da Câmara, houve muito mais do que rituais formais de homenagem. A emoção tomou conta de cada um de nós e de todos…
Conheci a família de Luís bem antes dele nascer. Morávamos perto, nós, na Av. José Bonifácio entre as ruas 1 e 2, D. Eliza, seu Marim, seus avós, logo no primeiro quarteirão da rua 1. Na virada da esquina. Fiz curso preparatório de admissão para o ginásio com D. Eliza, em companhia do Marcos e do Henrique Crisci. Suas lições permanecem vivas em minhas lembranças, assim como sua vibração diante dos resultados dos exames.
O tempo passou, pude conviver com Eloíza, irmã do Luisinho, no seu mandato de vereadora em Américo Brasiliense. Guardo no coração o convite que ela me fez para falar na Semana da Mulher na Câmara de Américo. Sorriso largo, olhos iluminados, como os de Luís. Herança dos pais, Luís Alberto e Manoelita Aparecida.
O encontro com Luís aconteceu na luta por fazer valer um novo olhar aos portadores de necessidades especiais. O interesse e compromisso de Luís pelas pessoas portadoras de deficiências começou muito antes dele ter sofrido um acidente que marcou profundamente sua vida. Quando cursava a Faculdade de Ciências Biológicas em Araras, dava aulas de natação para um grupo de crianças portadoras de Síndrome de Down. Tinha com o grupo um cuidado especial, parte do sonho que sempre o moveu de rever tabus, de não tratar o portador de necessidades especiais como diferente, olhado preconceituosamente aqui e acolá.
Os caminhos da vida o levaram a sentir na pele o peso de tais preconceitos. Sentimento que, por nenhum momento, abalou sua fé, sua força guerreira, sua vontade de ir além.
Depois de um acidente automobilístico, passou por uma experiência viva, de tentar vencer muitas e muitas barreiras, nas quais as portas da cidadania se abriam, mas também se fechavam. Nunca se contentou com respostas evasivas e com dissimulações. Luís mostrou, em toda a vida, uma tenacidade invejável. Em fins de 1993, submeteu-se, em Cuba, a um programa de intervenções clínicas e a um intenso trabalho de reabilitação que o ajudaram a usar melhor seus recursos físicos. Entretanto, Luís não queria benefícios só para ele. Sua vida foi movida por um sentimento de solidariedade, de amor maior, de querer dividir com toda a família da Udefa, União dos Deficientes Físicos de Araraquara, a força da sua luta por ser sujeito de direitos. Ainda mais, você sempre nos mostrou que amigos, companheiros têm um código próprio, o do coração e nele você sempre estará presente.
No coração de sua família de sangue, de sua família do coração, a Udefa, de todos os que, como eu, aprenderam com você inúmeras lições. Luís foi de uma coerência muito especial, vinda do fundo de sua alma, da defesa da cidadania, da vivência dos desafios.
Pessoas como você não morrem. Permanecem em nossos sonhos, em nossas lutas, mostrando-nos que não se pode abrir mão dos princípios da ética, dos compromissos com a verdade. O desafio de ter um Programa Municipal dirigido aos portadores de deficiências que você ajudou valentemente a construir continua aceso. Permeado pelos seus, pelos nossos sonhos. A vontade de não se deixar subjugar, que você sempre demonstrou, permanece inteira. Fica sua lição de vida, lutador, despojado das coisas materiais, das vãs disputas pelo poder. Lição para todos nós. Meu abraço afetuoso à Eloíza, à Manoelita, à toda sua família da Udefa. Não tenho dúvida de que tem mais uma estrela no céu de Araraquara e que seu brilho vai nos impulsionar a levar adiante a luta pela cidadania plena dos deficientes, sujeitos legítimos de direitos.
Mais uma pausa triste…uma homenagem
A professora Maria Helena de Arruda Gilson Parayba nos deixou neste final de semana. Professora, orientadora educacional, fez de sua vida uma continuada luta pela formação dos jovens, pelo nosso futuro. Educadora, no sentido pleno da palavra, semeou uma boa sementeira. À Maria Antonieta, sua filha querida, meu abraço carinhoso de solidariedade.
Um toque final de alegria
A inauguração do Centro de Referência do Jovem e do Adolescente na última quinta-feira nos deu sinais de alento. Reconhecimento do fértil caminho que vem sendo trilhado pelo Programa de Atendimento Integral à Saúde do Adolescente, PAISA, do qual nos orgulhamos como cidadãos araraquarenses. Nos olhinhos vivos dos adolescentes, nas marcas de mãos, anônimas ou não, deixadas em uma das paredes do Centro, havia sinais de esperança. Cheiro de vida! De investimento no futuro de nossa cidade! Um abraço carinhoso às guerreiras do PAISA!
Boa semana a todos! Euza, um abraço no seu coração. Acabo de saber da morte de Dinda, sua companheirinha. Que a secura do ar não nos tire a saliva da vida. Até a próxima!
(*) É coordenadora do Mestrado da Uniara e colaboradora do “JA”.