Vera Botta (*)
De 13 de maio a 20 de novembro: uma distância conquistada.
Pouca gente sabe mas a ONU proclamou 2004 como o Ano Internacional para Celebrar a Luta contra a Escravidão e sua Abolição, marcando o bicentenário da proclamação do primeiro estado negro, o Haiti, símbolo da luta e da resistência dos escravos.
No Brasil, podemos dizer que a abolição, proclamada há 115 anos efetivamente significou liberdade e garantia de direitos aos negros??? NÃO e NÃO. Temos a comemorar, no governo Lula, a criação da Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial com status de ministério, o que demonstra a vontade política de um governo que sabe ser o Brasil berço de metade dos cerca de 150 milhões de afrodescendentes do continente.
Oxalá, tenhamos, de fato, a implementação da lei n 10.369 de 9/1/2003, que determina a obrigatoriedade da temática História e Cultura Afro-Brasileira nos currículos escolares!!! Que tal começar por Araraquara???
E o preconceito nosso de cada dia, existe?
Só não vê quem não quer… O racismo, não só em relação ao negro, mas como instituição de poder e dominação não foi proibido constitucionalmente. De fato, a constituição de 1988 criminalizou o racismo. Ao fazê-lo, reconheceu a existência de desigualdades raciais. O Brasil não é mais a senzala sob a chibata da minoria, como bem disse Frei Beto, mas temos nas exclusões, nas repressões diretas ou escamoteadas, marcas concretas de discriminação racial. Profissionais de nível superior afrodescendentes recebem somente 70% em relação a profissionais brancos nas mesmas funções. E o que dizer da pecha de povo ignorante, passivo, de condutores de cultura de valor menor, atributos impostos injustamente aos negros???
Apesar de distanciadas no tempo histórico, não se pode separar a luta dos escravos de ontem e a violência de hoje dos poderes e da sociedade contra a comunidade negra. Sem a materialização dos direitos sociais, econômicos e culturais dos afrodescendentes, temos, na verdade, uma liberdade truncada. É absolutamente necessário completar a abolição.
Cidadania sem preconceitos
Em Araraquara, a criação de um Centro de Referência da Cidadania e, mais ainda, o Conselho Municipal de Combate à Discriminação e ao Racismo foram avanços significativos na esfera institucional. Como seguir adiante??? Com políticas públicas efetivas, autonomia de decisões e recursos financeiros necessários ao desenvolvimento de projetos adequados à realidade. Nossa Morada também tem seus símbolos de resistência. Desde Adolufã e Bambaná, os quais teriam, segundo registro oral, há cerca de 236 anos atrás, organizado o primeiro quilombo na região, passando por Damião do batuque, Benta Raquel, Benedito meu nego às batalhas presentes expressas na realização do Festival Comunitário Negro Zumbi – Feconezu, a todas as lutas pela valorização da consciência negra, caminhos vêm sendo trilhados, sonhos vêm sendo sonhados. É hora de mais ação.
Um fórum permanente de discussão sobre a questão racial em Araraquara foi votado em 13 de maio. Tem que sair do papel. O movimento hip hop tem denunciado o racismo e a discriminação impostos pelo sistema à juventude negra. Merece todo apoio institucional. Estamos, pois, em condições de implantar em nossa Morada uma política de referência. Para a cidade. Para o Estado. Para o Brasil. Para podermos ter uma sociedade mais igualitária, onde brancos e negros possam “viver e não ter a vergonha de ser feliz”, como diz Gonzaguinha.
A trajetória do 13 de maio ao 20 de novembro
A comunidade negra, em sua grande maioria, já há algum tempo não mais comemora o dia 13 de maio. A farsa da Lei Áurea deixou ao longo do tempo revoltas e reflexões a serem discutidas. A comunidade negra adotou o dia 20 de novembro como um referencial histórico na luta pela igualdade. A morte do seu maior líder – Zumbi dos Palmares – neste dia marca toda uma história de lutas, simbolizando a resistência de um povo.
Araraquara sediará nos dias 26 e 27 deste mês a “Conferência Regional de Promoção da Igualdade Racial”. Queremos menos retórica e mais ação!!!
Notinha da Câmara: a mudança do regimento votada na última sessão, ao permitir que uma Comissão Especial de Inquérito se instale com o requerimento de um terço da Câmara, sem discussão do plenário deixa dúvidas…Sob pretexto de valorizar a democracia interna, corre-se o risco de banalizar o mais importante instrumento de investigação parlamentar. A história dirá…De olho nela!!!
A Coluna fica por aqui! Parabenizando todos aqueles que lutam para promover a igualdade de raças e desejando que este 20 de novembro não seja apenas uma reflexão da comunidade negra. Que seja um alerta a todos. Afinal, somos ou não iguais como seres humanos??? Boa semana a todos. Até a próxima!!!
(*) É vereadora pelo PT e pesquisadora da Uniara.