Rua 5: um espaço para todos?

Edinho Silva (*)

Penso que situações conflituosas e embates cujos discursos adquirem um tom “emocional”, como ocorreu na última segunda-feira à noite, na Biblioteca Municipal, possuem uma origem mais profunda e arraigada do que podem sugerir as motivações óbvias até agora apresentadas.

Partindo dessa premissa e adotando uma perspectiva objetiva e desapegada, procuro examinar, intrigado, quais seriam as razões que levaram personalidades públicas, políticos, moradores e comerciantes da Rua 5 a se posicionarem veementemente contra seu projeto de melhorias.

Como prefeito, quero de antemão reconhecer a falha dos técnicos da Prefeitura que não comunicaram ao CONDEPHAT (Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Artístico e Arqueológico do estado de São Paulo) os objetivos do projeto – o que foi prontamente resolvido. Entretanto, tal falha não pode ser utilizada como justificativa para encobrir críticas pouco consistentes ao projeto que, por sua vez, revelam, além do desconhecimento em relação à proposta, a existência de algo mais nessa polêmica.

São duas as principais críticas daqueles que se contrapõem ao projeto: a primeira é de que esse recurso, obtido junto ao Governo Federal, deveria ser empregado para resolver os problemas mais urgentes do município; e a segunda é de que as melhorias alterariam as características históricas da Rua 5.

Considero as pessoas que têm se posicionado contra o projeto relativamente bem informadas e, deste modo, preocupa-me o desconhecimento do fato de que o recurso disponibilizado era exclusivamente para investimento em patrimônio histórico. Portanto, ele não pode ser destinado à pavimentação asfáltica e nem à compra de medicamentos. Dessa forma, se os recursos não fossem destinados pelo Governo Federal para Araraquara seriam para outro município. Mais intrigado, pergunto-me: desconhecimento ou manipulação da opinião pública, motivada por interesses privados ou por má fé?

No que diz respeito à segunda crítica, cuja motivação é a preservação das características históricas da Rua 5, retomarei resumidamente quais serão as melhorias propostas, lembrando que o projeto foi discutido durante o ano passado por intermédio dos meios de comunicação, especialmente os jornais, e há algum tempo se encontra exposto no Paço Municipal.

As melhorias são: iluminação, recuperação dos paralelepípedos, alargamento e adaptação das calçadas aos portadores de deficiências físicas e visuais, e instalação de mobiliário urbano, que a rigor significa a colocação de bancos para os pedestres. Quais dessas melhorias modificariam as características históricas da Rua 5? Os oitis que são tombados só serão ressaltados com as melhorias e os paralelepípedos, mesmo que ainda não tombados pelo patrimônio histórico, representam um período histórico da arquitetura local, serão reconstituídos.

Retomando minha premissa de que as críticas não sustentam o visível desconforto daquelas pessoas frente ao projeto de melhorias na Rua 5 – uma vez que o mesmo foi rechaçado como uma ameaça, e não examinado em seu mérito de forma desarmada -, continuei a investigar e me deparei com uma característica da Rua 5 que efetivamente será alterada e que diz respeito a sua história recente: ela deixará de ser apenas um corredor para aqueles que possuem carros, e passará a ser um local para pedestres e convivência pública com o alargamento das calçadas.

Outros cidadãos que normalmente não circulam por esses quarteirões, como os moradores dos bairros mais distantes, numa tarde de sábado ou no domingo, poderão então vir passear na Rua 5, se sentar num banco e desfrutar o encanto daquele corredor verde formado pelas duas fileiras de oitis. O rebaixamento de guias para cadeirantes, a sinalização de solo, os semáforos sonoros e prioritários para pedestres tornarão a Rua 5 mais democrática. Com essas melhorias, a população da melhor idade, que já doou o seu quinhão para a construção da nossa sociedade, também elegerá aquele espaço como mais um local de lazer em Araraquara.

A questão que precisa ser respondida é: a quem interessa a idéia de que preservação histórica é incompatível com a democratização dos espaços públicos? Concepção que se encontra na contramão de tudo que é defendido pelos especialistas da área.

Apesar da resistência de alguns em reconhecê-la como um espaço público, a Rua 5 para ser preservada tem que efetivamente pertencer aos moradores da cidade.

Quando o conjunto da cidade não se sente parte/participante dos espaços que deveriam ser públicos, também não se mobiliza para defendê-los. A nossa história está marcada por exemplos, desde a demolição do antigo teatro até o alargamento sem critérios das ruas e avenidas da área central quando oitis, “irmãos” desses da Rua 5 foram arrancados sem qualquer consideração histórica. O contraditório é que os grupos políticos que lideraram esse descaso com o nosso patrimônio histórico estavam amplamente representados na Biblioteca Municipal na ultima segunda-feira. Oportunismo político? Bem, essa é uma outra história.

O saudoso Rodolfo gostaria desse debate! Grande amigo, historiador que dispensa comentários, lutou pela preservação da memória de Araraquara não para si, nem para poucos, mas para seus verdadeiros donos: o povo!

Então, quem não pode apreciar os encantos da Rua 5?

(*) É prefeito reeleito, sociólogo formado pela Unesp de Araraquara, mestre em engenharia de produção pela UFSCAR, ganhador do selo Prefeito Empreendedor do Sebrae e do prêmio Prefeito Amigo da Criança da Fundação Abrinq.

Contraponto

Editorial faz uma análise crítica sobre o discurso do prefeito Edinho Silva que s.m.j. mostra-se um dominador e, como tal, não gosta de ser contrariado. Página 2

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