Priscila de Faria Gaspar (*)
Parece que todo o final de ano é a mesma coisa: paramos para pensar no que fizemos, no que deixamos de fazer. Podemos sentir uma certa culpa, às vezes um arrependimento… Então, começamos a lista de promessas para o próximo ano: parar de fumar, fazer exercícios, estudar mais (ou voltar a estudar), emagrecer, cuidar melhor da saúde, reatar antigas amizades… e por aí vai.
Sabe-se que quem faz promessas de Ano Novo têm mais chances de realmente obter resultados do que aquelas que simplesmente têm um desejo mas não fazem promessas. Ainda assim, muitas fazem promessas que não dão em nada. Chegam a repetir a mesma lista, anos após ano, deixando sempre para tentar no próximo.
E qual será a diferença entre as pessoas que realizam suas promessas e as que não realizam? Será uma questão de sorte ou há diferenças significativas no empenho dessas pessoas? É claro que, para certas coisas que desejamos existem fatores que não dependem apenas da nossa vontade… E existem também os desejos que são impossíveis considerando as condições de vida atual
Portanto, o primeiro passo é verificar, dentre os nossos desejos, aqueles que são realizáveis e que dependem exclusivamente de nós mesmos. Nunca devemos colocar metas que dependam da atitude de outras pessoas ou de outro fator externo, como um novo plano econômico do governo ou ganhar na loteria…
Como, por exemplo, para a adolescente que prometeu a si mesma que no próximo ano arrumaria um namorado. É óbvio que se ela ficar trancada em casa, tiver um comportamento anti-social, evitar até mesmo os contatos pela Internet, não adianta esperar que alguém vá bater à sua porta procurando-a com esse intuito…
Porém, ainda que ela se proponha a sair, conhecer novas pessoas, cultivar amizades, não há garantias de que conseguirá um namorado. Portanto, existem fatores externos à nossa vontade que devem ser claramente diferenciados daquilo que depende exclusivamente de nós, para evitarmos o risco de uma decepção. No exemplo citado, se a menina prometer a si mesma ser mais sociável e procurar estabelecer novos laços, terá uma proposta que depende exclusivamente de si mesma, e se sentirá realizada ao obter isso (com ou sem namorado!).
Dessa forma, o segundo passo, muito importante, é definir claramente o que é necessário ser feito para que o objetivo seja alcançado. Ter um plano com estratégias definidas parte por parte, facilita sua execução. É nesse ponto que reside a diferença entre um sonho e um objetivo: um sonho existe apenas no plano do desejo, do imaginário, enquanto que um objetivo é algo que se busca realizar e concretizar no plano real.
Prometer, da boca para fora, sem se comprometer, é fácil! O difícil é transformar um desejo em algo que seja realizável. Dessa forma, para realizar uma promessa de Ano Novo é necessário definir muito bem qual é seu objetivo ou meta e, a partir daí, traçar um plano que possa ser facilmente executado, sem nada que exija uma transformação radical de sua personalidade, tampouco venha a trazer sofrimento ou constrangimento.
Se um estudante promete a si mesmo que no próximo ano não vai tirar notas vermelhas, é necessário um compromisso consigo próprio no sentido de aproveitar ao máximo as aulas, participar de todas as atividades escolares, realizar as tarefas para casa e preparar-se, dia após dia, para as avaliações. Não adianta passar o ano pensando apenas em se divertir e lembrar da promessa na hora de receber o boletim ou, na melhor das hipóteses, na véspera das provas! O mesmo vale para quem quer emagrecer e só lembra da promessa na hora que precisa comprar roupas… Por outro lado, se esse mesmo estudante prometer a si mesmo que irá estudar quatro horas diárias, além do período que permanece na escola, é bem provável que desista da promessa de ano novo antes do término do primeiro mês letivo! Da mesma forma, se o sujeito se obriga a duas ou mais horas de exercícios físicos diários e uma dieta muito rigorosa para emagrecer, acabará desistindo…
Daí a importância de se estabelecer metas que sejam executáveis e que não causem sofrimento extremo. É óbvio que, qualquer mudança de comportamento, sempre implica em certo desconforto. Às vezes o desconforto não se deve ao novo hábito em si, mas simplesmente por ser algo novo! Temos, em geral, grandes resistências para mudar, para abandonar o nosso mundinho conhecido e aparentemente seguro, mesmo que certas situações sejam desagradáveis.
Para quem deseja parar de fumar também é necessário estabelecer estratégias. Algumas pessoas podem necessitar do auxílio de medicamentos a base de nicotina para controlar a dependência química, enquanto que para outras, freqüentar palestras ou um grupo de auto-ajuda pode ser mais eficiente. É importante identificar em quais momentos tende a fumar mais para ter uma estratégia específica para cada situação. Muitas pessoas, quando deixam de fumar, ficam sem saber o que fazer com as mãos em certas situações sociais, o que pode gerar grande ansiedade. Dessa forma, carregar consigo um objeto que possa ser manuseado, pode ajudar a controlar a ansiedade até que o hábito de segurar o cigarro tenha sido eliminado (mesmo que se corra o risco de se habituar ao novo objeto!). O mesmo vale para a atividade oral do ato de fumar, que pode ser substituída por mascar chicletes, por exemplo.
Qualquer que seja sua Promessa de Ano Novo é importante enfatizar que se trata de um compromisso para consigo próprio. Imagine que você estabelecesse um compromisso muito sério com seu melhor amigo ou com a pessoa amada. Faria de tudo para cumpri-lo, não é? Da mesma forma, deve agir consigo próprio! Deve lembrar que você é a principal pessoa na sua vida e que merece o seu próprio respeito! Em determinados momentos pode sentir-se enfraquecido e necessitar de apoio externo. Não é fácil executar uma mudança quando não se tem apoio de outras pessoas, mas você deve lembrar que o compromisso é consigo, com mais ninguém. Pedir ajuda a alguém de sua confiança pode realmente ajudar, mas existem certos riscos, como o de ficar se sentindo cobrado pela outra pessoa e acabar desistindo em função da pressão! O mesmo é válido quanto a contar para todo mundo sua decisão, pois se por um lado pode ajudá-lo a se manter firme, por outro pode trazer brincadeiras, críticas e julgamentos que, além de desagradáveis, são totalmente desnecessários. Assim, pense bem antes de solicitar o apoio ou comunicar sua decisão aos demais. Lembre-se: o compromisso é seu!
FELIZ 2004!
(*) É Psicanalista, Terapeuta de Regressão Filiada à Sociedade Brasileira de Psicanálise Integrativa, Mestre em Ciências pela USP.