Antonio Delfim Netto (*)
Existe um quase consenso em torno da necessidade de conter o crescimento das despesas do governo que há doze anos aumentam religiosamente 6% ao ano em termos reais, enquanto o PIB cresceu míseros 2,4% (média anual). Chegamos naquele ponto em que o Estado brasileiro inchou tanto que não cabe mais no PIB brasileiro. Isso depois de vender o patrimônio público e se endividar escandalosamente na última década do século passado. Para sair dessa situação é preciso que o PIB cresça mais depressa e que seja contido o avanço do tamanho do Estado.
Uma coisa é a compreensão desses fatos, outra é a forma como o governo pode enfrentar o problema. É preciso separar desde logo aquilo que é inexeqüível politicamente, por exemplo: não existe a menor possibilidade de cortar despesas na Saúde, na Educação e na Previdência. E é inviável reduzir o alcance dos programas sociais, como as bolsas Família, Alimentação, Luz para Todos, etc. Eles têm que continuar até que a economia ofereça os empregos suficientes para absorver os excluídos do mercado de trabalho. Se o governo tentar, forma uma massa crítica de oposição que inviabiliza quaisquer medidas.
Apesar da economia estável e de ter superado o constrangimento externo no governo Lula, o país ainda enfrenta uma situação financeira delicada por causa do alto nível de endividamento público em relação ao PIB e do fato que a carga tributária bateu no teto. São dois problemas formidáveis, duas tenazes que tolhem a ação do governo quando tenta estimular o crescimento mais rápido da economia. É uma ilusão pensar que essa armadilha se desmonta em curto prazo. Não se imagine que é possível cortar juros ou impostos da noite para o dia e multiplicar investimentos no curto prazo. O que pode ser feito de imediato, com inteligência, é alongar os prazos de recolhimento dos impostos e reduzir o seu peso sobre a folha de salários. Com isso, libera capital de giro a custo zero para o setor produtivo, aliviando a pressão dos juros altos.
É fundamental que o governo formule um programa em que a sociedade possa acreditar. Basicamente é estabelecer um teto para as despesas de custeio do governo pelos próximos três ou quatro anos (aquelas que vem aumentando 6% reais ao ano). A correção anual deve se limitar ao índice da inflação. O programa deve conter simultaneamente o objetivo de atingir um aumento de produtividade nos serviços estatais, que não precisa ser maior que 1,5% ao ano, praticamente igual à taxa de crescimento da população e perfeitamente factível por um simples esforço da administração. É preciso mostrar à sociedade que é falsa a informação que a educação e saúde vão mal por falta de recursos. O Brasil gasta uma proporção do PIB maior do que a da maioria dos países nesses itens, só que gasta muito mal, (a vinculação facilita o gasto improdutivo), os controles são inexistentes e as auditorias falham. Daí ser perfeitamente possível obter expressivos ganhos de produtividade naqueles setores e na Previdência, onde os serviços são uma indecência.
Se existe alguma coisa que depende efetivamente da tão decantada “vontade política” é a ação dos governos nesse contexto. Não se vai cortar recursos. Simplesmente vai estabilizar os gastos e eliminar desperdícios que são imensos. No segundo ano de um programa dessa natureza já vai ter sobra de recursos para fazer o que é fundamental: reduzir a carga de impostos e aumentar o investimento público para dar suporte à expansão do setor privado que é o principal agente do desenvolvimento.
(*) E-mail: dep.delfimnetto@camara.gov.br