Léo Rosa de Andrade (*)
“Valeu a pena? Tudo vale a pena \ Se a alma não é pequena”, Mar Português, em Mensagem (1934), Fernando Pessoa. No poema, conversam Henrique de Avis (Sagres), Vasco da Gama e Fernão de Magalhães.
Sujeitos tais quais esses, no tempo em que a Terra era biblicamente plana, com ciência, mapas, navios, arredondaram-na, desbravando-a com as Grandes Navegações. Almas do tamanho do mundo, o mundo de Portugal:
“Ó mar salgado, quanto do teu sal \ São lágrimas de Portugal! \ Por te cruzarmos, quantas mães choraram, \ Quantos filhos em vão rezaram! Quantas noivas ficaram por casar \ Para que fosses nosso, ó mar!”.
Grandezas inscritas no Tempo; dentre outros, Luís de Camões: Os Lusíadas (1572), poema épico às aventuras lusitanas, aos que singraram os “mares nunca dantes navegados”. Dentre os mares, os do Brasil.
Para o bem e para o mal, esses personagens, inobstante revisões históricas, são gigantes. Aí, uma graça da mediocridade: “todo mundo” publica o verso de Pessoa avaliando que a “sua” alma é grande tal e qual.
Vivemos mesmo com a alma alcançada por tanta distinção? Friedrich Nietzsche tem o prova mágica com seu eterno retorno: Se tivesses que repetir sempre e sempre a vida que viveste, tu a refarias igual?
Desconfio que nos esticamos na medida, ou que nos falta algo de humildade. Pensemos nas religiões e suas promessas, que todas as têm, ou não teriam crentes: ameaçam com horrores, prometem exultação.
Exemplos de efeito: espíritas têm-se em evolução. Todo\as os espíritas creem que se tornarão um espírito de luz; serão eterno desenvolvimento espiritual. Não conheço um só que reencarnará como um inseto qualquer.
A cristandade se encomendou ao Céu. Todo\as se têm numa irmandade em Cristo. Ninguém é fariseu (fariseu, filistino, palestino, que Cristo odiava a não poder mais). Alguém tem a humildade de se supor no Inferno?
Nada!, toda a gente cristã é alma purificada ou em purificação. De tão boa que é, Jeová, “na sua infinita bondade”, haverá de percebê-la na multidão e a terá aos seus cuidados. Ninguém se declara no rumo do castigo eterno.
Por fim, um tipo que não tem muito credo, mas não sabe ser incréu\ia. São “amados seres”, “gratiluz”, auto-havidos entes espirituais. Não há um\a que se dê por obscurecido\a. Ofuscam-se na própria presunção\a.
Referi humildade: ser consciente das próprias limitações, ter algum acatamento da simplicidade, lembrar que “somos pó e ao pó retornaremos”, parar de “vangloriar-se, batendo no peito”, obrando da boca para fora.
Pessoa e Camões, que sabiam por “instrução e sabedoria”, não se davam a “tocar trombetas” para anunciar os próprios feitos, eram “mansos e humildes de coração”. Seus versos falam por eles; falarão pela eternidade.
Escrutinando a História, encontramos mossas nela, vestígios norteadores. São o legado de vidas marcantes que dão sentido ao que chamamos Civilização, tantas vezes nada civilizada. Não são vanglória; são narração.
Muito\as apreciamos contar vantagens, mas, se nos medirmos com sinceridade, nos encontraremos em tamanho normal. Contardo Calligaris, genial, desejava, apenas, que a vida lhe fosse interessante. Nada mais.
Não tenho outra tentação. Desejo igual. Sobre quem se têm por além da média, creio – e encomendo – que têm alma pequena, serão espíritos das trevas, involuirão, irão para o Inferno. Gente chata, é o que são.
(*) É Doutor em Direito pela UFSC, Psicanalista e Jornalista.