Tenente Dirceu Cardoso Gonçalves (*)
Na manhã da última sexta-feira (09), quando retornava a São Paulo no voo Latam LA3311 partido de São José do Rio Preto, o Comandante anunciou a tripulação para se preparar para o procedimento de pouso em Guarulhos e orientou aos passageiros para manter os cintos afivelados pois a aeronave ingressaria numa área de turbulência devido a formação de nuvens com gelo. Enfrentamos a situação, que foi leve, e logo em seguida pousamos. Jamais poderia imaginar que, naquela área que sobrevoávamos, três horas depois, o mesmo problema (nuvens de gelo) levaria à tragédia de Vinhedo, onde 62 ocupantes do avião da Voepass, vindo de Cascavel (PR) perderiam a vida.
O incidente no meu voo foi imediatamente superado. Mas as imagens a que tivemos acesso (eu e todos os brasileiros) pela TV e redes sociais, no meio da tarde, são altamente preocupantes. O que teria levado aquele avião a deixar de planar e cair como uma pena solta no espaço? Qual teria sido a sensação dos passageiros, que os especialistas da área dizem ter morrido de politraumatismo decorrente do impacto da cabine com o chão? Será comum um aparelho como aquele ou similar comportar-se da forma que vimos? E, principalmente, como prevenir para que isso não ocorra nunca mais?
Informado o sinistro, as autoridades da área movimentaram-se e, após recolher as vítimas e seus pertences, coletaram partes e equipamentos do avião com interessam ao levantamento do acontecido. Espera-se que em 30 dias hajam as primeiras conclusões, sem prejuízo da continuidade da investigação. Mas, antes dessa parte formal e legal, seria interessante perguntar à empresa proprietária do avião e aos fabricantes do motor, da cabine, dos equipamentos de voo, bem como a Associação representativa da classe dos pilotos, o que poderia levar um veículo como aquele ao sinistro que o vimos sofrer no intervalo entre sua desestabilização e o choque ao solo. O mesmo questionamento poderia ser feito aos centros de ensino e fiscalização aeronáutica. Se desses informes surgissem qualquer divergência, elas poderiam contribuir na mudança da escala de procedimentos e evitar a repetição de eventos como o da última sexta-feira. Com informações e orientações mais compartilhadas, os acidentes poderiam diminuir ou até nem acontecer. Será que voar em meio à cortina de gelo é seguro e todas as aeronaves são capazes disso?
Os operadores aeronáuticos garantem a nós – os leigos – que o avião é o transporte mais seguro. Não duvido que seja, mas também sou levado a crer que seu impacto vem do fato de, quando ocorre o acidente, todos os envolvidos morrerem quase que invariavelmente e, como são dezenas, até centenas agrupados numa cabine, isso leva ao nível de tragédia. É por essa razão que entendo ser imperativo ter todas as informações sobre aeronaves e sua operação em diferentes condições climáticas. A adoção de providências para desviar do perigo iminente, talvez seja uma atenuante.
De todo acidente aéreo restam as informações oficiais – que são confiáveis – mas, em paralelo, ficam especulações das mais diversas que levam a população leiga ao temor de voar. No presente episódio, os estudiosos, os centros de saber e os encarregados da fiscalização deveriam cruzar informações conforme a cultura de cada um desses entes. Se ao final dos levantamentos surgir alterações de procedimentos – por menores que sejam – terão contribuído para a segurança do voo e, também, pela tranquilidade do usuário.
Existem crenças como a de que um problema aeronáutico nunca vem sozinho. Os fatos dessa semana, apesar de seu pequeno porte, dão esse indicativo. Mais de 150 voos foram cancelados nos últimos dias porque um cargueiro teve um pneu danificado ao decolar do aeroporto de Viracopos (Campinas), onde teve de retornar e impediu a operação da pista por duas horas. Em Florianópolis (SC). um avião de passageiros teve problemas no trem de pouco e impediu a pista durante 18 horas. Felizmente, nessas duas ocorrências não se registrou vítimas, apenas danos materiais e prejuízos operacionais…
(*) É dirigente da ASPOMIL (Associação de Assist. Social dos Policiais Militares de São Paulo)
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