Antonio Delfim Netto (*)
Seja quem for o próximo presidente da República, ele terá que dedicar uma atenção muito especial ao setor agrícola, que vive uma das piores crises dos últimos tempos. O clima não ajudou nesses três anos nas regiões sul e sudeste e o governo menos ainda, com a sua imprudente, imprevidente (tanto variam as previsões de crescimento do PIB!) e desnecessária política monetária. Devido à super valorização do Real produzida pela “mão pesada” dessa política, os preços agrícolas têm sido extremamente comprimidos, tornando muito difícil ao agricultor sobreviver com um mínimo de rentabilidade. Se de um lado isso beneficia as populações mais pobres, notavelmente nas áreas urbanas, de outro produz o empobrecimento do produtor e das comunidades que dependem do seu trabalho. Com a renda diminuída e o patrimônio ameaçado, o agricultor vai produzir menos.
O que o governo tem que prestar atenção é que num futuro muito próximo a oferta de alimentos vai diminuir. No momento em que isso acontecer, os preços vão subir e seu crescimento se dará numa velocidade muito maior do que a constante redução de preços que tanto vem ajudando a combater a “carestia”. Ao sentar naquela cadeira em Brasília o presidente, seja quem for, terá que pensar mais ou menos o seguinte: se eu deixar a agricultura “se ferrar”, adeus Fome Zero , adeus Bolsa Família … e o salário mínimo jamais voltará a comprar duas cestas básicas como atualmente. Na medida em que a alta de preços dos alimentos chegar na mesa do trabalhador, adeus também à aprovação popular…
Se pensar um pouco mais , vai perceber que não terá sucesso realmente significativo na recuperação da oferta de empregos sem que a economia volte a crescer de forma robusta. E menos ainda deve imaginar que é possível fazer o desenvolvimento transferindo renda do setor agrícola para o setor urbano, a não ser quando existem ganhos excepcionais de produtividade. A agricultura tem demonstrado que é o setor mais produtivo da economia brasileira e por alguns anos se mostrou o mais rentável mas talvez por isso mesmo é a maior vítima da espoliação determinada pela política monetária .
Nos últimos dez anos, a agricultura ajudou o Brasil a superar alguns dos problemas mais dramáticos que restringiam o crescimento. O apagão energético de 2001, que incrivelmente “surpreendeu” a governança tucana e produziu uma queda estimada de 2% do PIB, foi um deles: se a produção agrícola não tivesse reagido naquele ano e no seguinte, nem mesmo o pífio crescimento do final do segundo mandato teria sido alcançado. Já no atual governo, as exportações do setor agropecuário foram o principal instrumento da libertação do Brasil da vulnerabilidade externa resultante de erros muito parecidos de política monetária nos dois mandatos anteriores. É preciso agradecer à agricultura a circunstância que, livre do constrangimento externo, o próximo presidente terá menos um problema a embaraçar o desenvolvimento brasileiro. Não apenas agradecer: terá que lembrar isso em cada um dos 1.461 dias de seu mandato.
(*) E-mail: dep.delfimnetto@camara.gov.br