Antonio Delfim Netto (*)
Só muito recentemente o governo percebeu que não pode continuar numa defensiva diante da marcha das exportações industriais, conformado com o argumento (falso) que o problema está na baixa produtividade do setor. É uma mistificação que durante muitos anos permitiu afastar da discussão as verdadeiras causas da queda da participação brasileira no comércio mundial.
Os números da OMC para o ano de 2007 apontam para um volume de exportações globais de valor superior a 16 trilhões de dólares. O Brasil, fechando com menos de 160 bilhões de dólares tem uma fatia de menos de 1% deste comércio. Nas duas últimas décadas, a evolução das exportações brasileiras foi medíocre em comparação com os nossos competidores. Nomeio apenas dois deles, China e Coréia, que em 1986 exportavam os mesmos 22 bilhões de dólares que nós, participando igualmente com 1.2% do comércio global: em 2007 responderam aproximadamente por 9% (1.4 trilhões) e por 3% (mais de 400 bilhões) das exportações mundiais, respectivamente. O Brasil chegou a subir para 1.4% e depois veio abaixo dos 1%.
O que aconteceu conosco? Nesse período repetimos sempre o mesmo erro de congelar o câmbio para controlar a inflação, tornando o investimento industrial no setor exportador o negócio mais arriscado do mundo e de menor retorno. Os governos se acostumaram a usar oportunisticamente o câmbio como uma variável para controlar a inflação. Diante da perda de dinamismo das exportações industriais, invariavelmente se apelava para a falácia da produtividade. Tenho insistido nesse ponto e o tempo só fez confirmar: a produtividade interna na indústria chinesa é rigorosamente a mesma da indústria brasileira. A diferença está na relação câmbio/salários de que nos descuidamos sistematicamente. Estimulamos um aumento do salário real que em si mesmo não é um mal mas estimulamos também uma extravagante valorização do real através do diferencial de juros.
Nos cinco anos de governo do presidente Lula as exportações voltaram a crescer, aproveitando o vigor da economia mundial e a valorização da produção agrícola e mineral. O Brasil soube ser bastante agressivo, beneficiando-se do duplo movimento ascendente dos preços e da demanda por matérias primas de que somos tradicionais e eficientes produtores. Isso é muito bom e devemos aproveitar, enquanto durar… Não devemos esquecer que esses preços podem flutuar fortemente, conforme a conjuntura mundial. O que dá sustentação ao crescimento da economia num horizonte mais longo é o desenvolvimento industrial. São os investimentos na expansão da produção e das exportações industriais.
Diante da queda nessas exportações, renasceu a disposição do governo de dar a partida nos programas da política industrial exportadora. A quantidade de produtos da indústria destinados ao mercado externo diminuiu. Só estão resistindo as exportações naqueles setores onde a componente importada é muito alta. Significa a introdução nesses setores do sistema de maquiagem, tipo "maquilladoras" mexicanas. Acendeu uma luz amarela em Brasília, sinalizando que é preciso agir antes que se crie uma nova dependência em nossa economia.
É tudo o que o governo não precisa.
(*) É Professor Emérito da FEA/USP. E.mail: contatodelfimnetto@terra.com.br