PLAYBOY de novembro (ainda nas bancas ou na Distribuidora Andrade), dentre as matérias devidamente ilustradas traz uma entrevista com o araraquarense que é diretor do Teatro Oficina, Zé Celso Martinez Corrêa. Ainda nesta semana, o escritor Ignácio de Loyola Brandão ao prefaciar livro da Janaína (Unesp), narrando a vida do polêmico artista, afirma que o Zé Celso vai de encontro a qualquer lógica construída pela sociedade.
Trata-se de uma reportagem formatada pela PLAYBOY que merece ser lida. Zé Celso fala de tudo e mais um pouquinho.
Sobre o “provincianismo de Araraquara dos anos 30”, resta só a história. Ainda mais neste mundo globalizado onde obviamente Araraquara está inserida. Mas, navegando com saudade pelo termo que inspira pureza, naturalidade, afetividade, lealdade, peito aberto de um caipira, sem nada de pejorativo, a reportagem do J.A. foi buscar o saber de Ivo Dall’Acqua Junior, enquanto contemporâneo do Zé Celso e que acompanha a trajetória do artista.
“Na verdade todos somos provincianos, todos somos oriundos de qualquer tipo de província. A gente se torna cosmopolita a partir das vivências. São Paulo é provinciano, Berlim é provinciano e Nova Iorque também é provinciano. As pessoas deixam de ter atitudes qualificadas como provincianas a partir das vivências, a partir do conhecimento, a partir da aceitação da diversidade, a partir do respeito pelo que os outros possam pensar e a partir de uma forma como as pessoas elegem o modo de agir e de olhar as coisas. E se não fosse esse provincianismo, quer dizer isso que as pessoas rotulam como tal, a gente não teria características tão interessantes.
Uma questão de
comportamento
Quando Jorge Amado conta uma história bonita, tendo como pano de fundo o ciclo do cacau, coloca Ilhéus como palco e cria um prostíbulo chamado Bataclã (que lá existe e serviu de inspiração). Ele mostra uma marca do comportamento das pessoas. Mostra como funciona a questão da religião, da libido, do erotismo, do poder… porque erotismo é muito ligado ao poder. Aí, quando vejo essa publicação vinda da Janaína que mostra uma Araraquara da qual eu tinha me esquecido, eu fiquei contente por ter- me lembrado dela que pontua, por exemplo, a presença da Dora (da Rua 8) e daquela atração que ela representava principalmente aos adolescentes (usava seus poderes mágicos para fazer uma demonstração com cigarro, numa fantasia erótica).
O livro mostra um lado de Araraquara que é inspirador. Olhado de fora é muito interessante… então, temos que ter muito respeito por essas marcas e eu não gosto do rótulo provinciano porque ele é um diminutivo e a província é origem de tudo.
Zé Celso
assumiu a
diferença
Mas eu queria falar outra coisa do Zé. Uma criatura muito interessante e como foi muito reprimido confessa algo da infância, da adolescência quando ele foi colocado de certa forma à margem porque era o diferente. Ele queria assumir essa diferença, não quis ter uma profissão convencional, não quis ter uma vida convencional. O Zé Celso não teve aquele sonho que as famílias induzem os filhos a ter: o da construção de uma relação social formatada. Ele acabou carregando o peso disso, mas, é um transgressor adorável. Gosto da forma como o Zé transgride mesmo quando ele possa estar parecendo um pouco sem educação. Porque há momentos que a gente precisa ser sem educação para poder pontuar coisas que merecem um olhar diferente.
Zé Celso
veicula a
cidade
Eu sou um dos araraquarenses que tem muito orgulho disso porque cada um mostra sua terra da forma como a vê. O que mais gostei do trabalho da Janaína (autora do livro sobre a vida do Zé Celso), foi justamente a apresentação do Ignácio que mostrou aquele lado gostoso e adorável do Zé. O Zé reflexivo, o Zé que propõe para você poder pensar, para poder observar, para concluir, para você poder formar também uma opinião com outros olhares.
Ignácio diz que o Zé
é a poesia, a temeridade,
a insensatez no mundo que
exige tudo no lugar,
que exige a lógica.
O Zé é tudo isso, mas, todos nós num determinado momento temos desejo de fazer isso. Numa crônica recente o Ignácio lembra do irmão do Zé Celso que perdeu o túmulo, o mausoléu. Até classifica o irmão como outros (que foram removidos de espaços em nosso cemitério São Bento), como pertencentes ao MST – Movimento dos Sem Túmulo. Nesse momento você tem vontade de se contrapôr, nesse momento você tem vontade de guerrear porque as pessoas tomam atitudes burocráticas e ferem a todos e não respeitam aquilo que se chama sentimento”.