(Artigo – Gustavo Ioschpe, Folha de S. Paulo 24/10/2006, enviado à redação do J.A. para merecer reflexão)
O SER HUMANO em geral e as vítimas da historiografia marxista (os brasileiros) em particular temos a tendência a acreditar que estamos numa evolução constante e que o progresso é inevitável. Mas essa esperança não é comprovada pela experiência histórica. Acredito estarmos passando agora por um momento de involução. Que parece programada para continuar.
O viés ideológico que fundou e animou o PT deixou de ser aplicável no começo dos anos 90. Lula se deu conta em 2002, e propôs um programa que era a negação de suas idéias dos 20 anos anteriores. Aproximou-se do centro para poder ser eleito e governar. Porém, não conseguiu gerar um projeto alternativo de país para preencher o vácuo que se instalara.
O projeto de governo foi substituído por um projeto de poder. E, com a voracidade de quem amargou 20 anos de ostracismo, parece ser um projeto de poder a qualquer custo. Esse programa se desenvolve em duas frentes: a programática e a institucional.
Na parte programática, vemos a criação de uma série de iniciativas destinadas a gerar melhorias de curto prazo nos setores tradicionalmente abandonados da sociedade, cujo voto é de obtenção fácil e barata.
Nestes enquadraria a expansão do Bolsa Família, o ProUni, os programas de agricultura familiar etc. Seu ponto em comum é lidar com a pobreza sem chegar às causas, garantindo sua reprodução ad eternum.
Pobreza se resolve com crescimento econômico e geração de empregos. Isso demanda melhoria de capital humano, investimento em infra-estrutura e melhorias do sistema jurídico, entre outras variáveis.
Acesso à universidade se dá com melhoras na educação básica, não com cotas. Mas não seriam essas medidas positivas? Sim, se viessem acompanhadas das reformas estruturais que fazem com que a geração seguinte não mais precise delas.
Atualmente, ocorre o oposto: as pequenas vantagens se financiam via aumento do tamanho do Estado, que prejudica o desenvolvimento. Os pequenos ganhos de hoje se dão às custas de perdas futuras. E o sucesso eleitoral da tática garante sua permanência.
Se não bastasse essa aridez programática, vem ainda o segundo eixo, de golpeio às instituições. Dinheiro público foi usado para comprar o Congresso, eliminando a relação de independência que deve existir entre os Poderes.
Aparentemente o mesmo dinheiro foi usado para comprar, de um criminoso, um dossiê que visava começar a campanha de destruição das lideranças da oposição. Já houve projetos de controle de jornalistas, do audiovisual. Agora já se fala de “democratização” da mídia e reforma constituinte.
Os dois eixos somam-se para criar um programa que desidrata a democracia de suas funções vitais, mantendo-a em existência apenas nominal. Com um Parlamento cooptado e uma população seduzida por migalhas, caminhamos rumo à estagnação econômica e ao retrocesso sociopolítico.
(Gustavo Ioschpe é mestre em desenvolvimento econômico pela Universidade Yale-EUA)