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Fora do foco

Antonio Delfim Netto (*)

Semana passada fiz um comentário sobre uma característica que envolve a discussão de nossos problemas econômicos: a capacidade de nos ocuparmos da questão errada, na hora errada, deixando de lado o que é substancialmente importante e que só ganha realmente a consciência das pessoas quando a confusão está armada e geralmente é tarde para evitar os danos. Anotei alguns casos que relaciono a seguir.

a) Nos anos 60/70 do século passado, um caso clássico de desvio de “foco”, o debate sobre o “aumento da concentração de renda determinado pelo crescimento perverso da economia…” Quase 10 anos consecutivos de robusto crescimento do PIB acima de 7%, chegando a 10% no meio do processo e atingindo o pico de 14,4% em 1973/1974, não foram capazes de estimular um debate sério sobre estratégias para o desenvolvimento brasileiro. Ele ficou circunscrito à questão da distribuição da “riqueza”, com uma compreensão equivocada a respeito dos benefícios do processo, ignorando uma verdade simples segundo a qual “não era possível distribuir aquilo que não foi produzido”. Durante anos disseminou-se a idéia que era preferível um crescimento mais modesto com distribuição mais generosa. Numa certa medida foi o que se tentou praticar nos 30 anos seguintes, com os resultados que todos conhecemos: crescimento medíocre e pior distribuição da pobreza.

b) Durante o brilhante Plano Real, nos anos 90, praticamente se interditou o debate sobre o enorme equívoco da manutenção prolongada de uma política de valorização cambial sustentada pelas maiores taxas de juros do mundo. O que se trazia ao debate era a falácia dos extraordinários ganhos de produtividade produzidos pela desinflação competitiva. As questões fundamentais da destruição de nosso comércio exterior, do acúmulo de déficits em conta corrente, do endividamento externo e interno e do conseqüente aumento exponencial da carga tributária, permaneceram subsumidas. Até o momento em que o Brasil quebrou sob o peso de um déficit de 100 bilhões de dólares em contas correntes e foi socorrido pelo FMI, em 1998. C)A discussão sobre o crescimento da carga tributária esteve praticamente interditada ao longo de todo o período em que se produziam os fenômenos que a geravam, entre 1994 e 2000: o crescente endividamento externo apesar da venda apressada de parte do patrimônio nacional, o aumento das despesas de custeio da máquina estatal de 6% em termos reais no período de FHC e a ausência de qualquer esforço de ajuste fiscal. O momento de tentar impedir aumento da carga tributária é quando começa o processo de crescimento da dívida pública e não depois que ela está feita e precisa ser honrada. d) Por último, a displicência com que vem se discutindo atualmente o problema da sobrevalorização do Real. Celebramos irresponsavelmente os números das exportações, sem que a sociedade tome consciência de uma nova tragédia anunciada: a queda dos investimentos no setor e a desistência de algumas centenas de empresas exportadoras, revelando a perda de dinamismo de nosso comércio exterior. É a reedição do caminho do constrangimento externo que tornou vulnerável a economia brasileira na passagem do Século. Estamos hoje menos vulneráveis aos choques externos, mas não somos imunes aos acidentes de percurso: a tragédia da queda nas vendas da carne brasileira devido ao problema da aftosa é um aviso que não podemos reduzir o suporte ao comércio exterior.

E-mail: dep.delfimnetto@camara.gov.br

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