“El Niño” aumenta o Risco Agrícola na agricultura

Antonio Delfim Netto (*)

Na semana passada conversamos sobre as perspectivas da economia para 2005, que deve continuar crescendo. O setor privado esta confiante e mostra disposição de expandir a produção diante da recuperação dos níveis de consumo e da renda da população. Nada ainda extraordinário, mas são os sinais que a economia reencontrou finalmente o caminho do desenvolvimento.

Estamos num período de festas e nesses momentos não é de bom gosto falar de problemas, mas não dá para ignorar a grave crise que pode destruir o trabalho que permitiu ao setor do agro negócio iniciar nos últimos dois anos uma fulgurante recuperação. Há cinco ou seis semanas, as pessoas razoavelmente bem informadas do governo (e fora dele) começaram a receber relatórios procurando antecipar os efeitos sobre o clima brasileiro do fenômeno conhecido, como “El Niño”. Conforme o grau de aquecimento das águas do Pacífico na altura do equador, ele produz mudanças de variável intensidade no clima do sul do Continente invertendo os períodos de estiagem e de chuvas e aumentado a sua duração. As observações não eram nada animadoras para 2005, a partir de fevereiro ou março. O que está se tornando dramático é que alguns desses efeitos já estão acontecendo, com uma estiagem fora do normal no Rio Grande do Sul e no norte de Minas Gerais e uma antecipação do período de seca no Nordeste, mais localizada no Piauí, para onde a fronteira agrícola caminhou nos últimos dois ou três anos .

Tínhamos chamado a atenção, no comentário anterior, para a mudança de cenário no comércio mundial no que se refere às cotações de nossos principais produtos agrícolas. Os preços da soja (em primeiro lugar), algodão, milho (menos, por causa do etanol) e trigo caíram bastante nos últimos seis meses. Não há muita esperança de recuperação até o início da comercialização das nossas safras de verão. O caso da soja é mais dramático, pois aumentamos a área de plantio e nossa produção vai topar com uma super safra americana e um certo esfriamento nas compras chinesas. Nossos agricultores estão diante da perspectiva de uma forte queda de renda, pois além dos preços deprimidos no mercado internacional ainda sofrerão os efeitos da variação cambial: os custos dos insumos para o plantio foram formados com dólar de R$ 3,00 e a venda da safra se fará a dólar de 1,70/1,80 Reais, se o governo continuar assistindo com indiferença à valorização do Real.

Se existe algo que não se pode perdoar ao governo é deixar a agricultura entregue à própria sorte, como aconteceu no passado recente. O Presidente Lula discute previamente com os sindicatos o valor do novo salário mínimo; dialoga com o pessoal do movimento dos Sem Terra; conversa com empresários da indústria e do comércio e esses encontros têm permitido contornar dificuldades e antecipar soluções de interesse das categorias e do país. A crise do agro negócio pode ser melhor administrada se o governo começar a conversar com os agricultores sobre a formação de estoques reguladores e sobre a agilização nos processos de financiamento de equipamentos, com prazos e taxas de juros suportáveis. O Banco do Brasil fez a sua parte razoavelmente este ano mas os procedimentos do sistema BNDES deixaram muito a desejar, pela demora e excesso de burocracia na concessão dos financiamentos. Investimentos importantes deixaram de ser realizados, inclusive na implantação de sistemas de irrigação que poderiam reduzir os riscos das lavouras em face das variações climáticas como as que já estão se verificando por conta da proximidade do El Niño.

(*) E-mail: dep.delfimnetto@camara.gov.br

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