Antonio Delfim Netto (*)
Tenho insistido que o maior desafio do próximo governo é o de reduzir a dependência econômica externa, que nos colocou numa situação extremamente delicada. Não quero dizer com isso que a dívida externa esteja fora do controle. Nem a dívida externa, nem a dívida interna estão dando sinais que tendem para o infinito, mas não há como minimizar a dimensão do esforço que será necessário para administrá-las.
Em primeiro lugar vai ser preciso superar o clima de desconfiança dos credores externos, que têm mostrado sérias dúvidas diante do comportamento de alguns indicadores, como por exemplo a relação Dívida Líquida/PIB. No início do atual governo, ela era de 30% e hoje essa relação é de 60% e crescente. Quando o credor vê o devedor aumentar muito rapidamente as suas dívidas ele tem a tendência a restringir o crédito e é isso que está nos acontecendo.
Uma boa parte dessa restrição do crédito se deve ao crescimento da aversão ao risco que se manifestou no mercado após os eventos terroristas nos Estados Unidos e que se agravou com a revelação das patifarias praticadas na contabilidade de grandes corporações americanas. Já havia uma queda importante no nível da atividade econômica, quando se verificou que eram falsos os números que sustentavam a valorização das ações, o prejuízo dos investidores foi enorme. Metade das famílias americanas tem grande parte de seus patrimônios nas Bolsas. Elas não aplicavam nas Bolsas por uma questão de elegância, mas como forma de poupança para ser desfrutada nas aposentadorias. As fraudes roubaram o seu futuro. Os investidores, empobrecidos, tornaram-se extremamente ariscos e cautelosos.
A aversão ao risco no exterior e alguns dos nossos indicadores internos nada brilhantes produziram a restrição de crédito ao Brasil. Como nossa situação de dependência de capitais externos é muito grande, a redução das linhas de crédito nos colocou rapidamente numa posição delicada. Fomos obrigados a recorrer ao Fundo Monetário para um novo empréstimo de 30 bilhões de dólares que vai nos permitir chegar ao final de 2002 de maneira mais ou menos confortável e em condições de fechar o balanço no ano que vem.
Isso vai dar ao novo governo algum tempo para tentar mudar essa situação. Mas terá que agir com extremo cuidado na questão da dívida, administrando os problemas sociais e os correspondentes sacrifícios que ela nos impõe. Certamente não podemos esperar algo muito brilhante em matéria de crescimento econômico, antes que se demonstre a real capacidade de avançar de forma importante na redução da vulnerabilidade externa. O Brasil tem que se livrar dessa dependência construída em oito anos de indesculpáveis equívocos de política econômica.
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