Antonio Delfim Netto (*)
Na campanha eleitoral de 1998, quando pleiteava a reeleição, o presidente Fernando Henrique foi bastante hábil ao conseguir esconder da população a crise cambial que se avizinhava e ao mesmo tempo convencer os eleitores que sua permanência no poder era indispensável para garantir os benefícios da estabilidade construída pelo plano Real. Com alguma facilidade e uma surpreendente cumplicidade da mídia, construiu-se um cenário no qual a idéia de mudança passou a ser sinônimo de alto risco e isso funcionou. Sem informação sobre o estado real da economia e dos negócios do governo e embalado pela promessa de recuperação dos empregos, o eleitor votou pela estabilidade. O choque veio poucos dias após a posse, em janeiro de 99, quando a crise cambial obrigou o governo a desvalorizar o real e a assumir com o FMI o compromisso de adotar uma política fiscal que garantisse um nível de superávit primário tranquilizador para os credores internos e externos.
Quatro anos depois, às vésperas de nova eleição presidencial, vivemos outra crise cambial e repete-se a tentativa do governo de assustar o eleitorado com o fantasma da mudança. Mas a mídia está um pouco mais esperta, as pessoas têm mais informações e o Presidente não se permite ser tão afirmativo. “Para piorar – disse modestamente a semana passada – deixe ficar como está, que não está tão mal assim”…
Não se pode insistir que tivemos uma política econômica virtuosa, quando fomos obrigados a pedir socorro ao FMI em três ocasiões num período de quatro anos, que se iniciou e termina com crises cambiais. O governo diz que o câmbio é vítima de um processo que acontece no exterior que produziu o aumento da aversão ao risco e a redução dos investimentos nos países “emergentes”. Isso é verdade, mas não explica o terremoto que nos atinge: outros países “emergentes” como o Chile e o México, por exemplo, submetidos às mesmas circunstâncias, tiveram pequenos aumentos no “risco país” e oscilações suaves nas taxas de câmbio. A diferença é que nenhum deles se endividou ao ponto em que estamos e não acumulou os problemas internos que nós temos.
O fato é que “a agenda econômica equivocada” a que se referiu esta semana um ilustre ex-ministro deste governo, num interessante debate no BNDES, produziu resultados absolutamente contrários ao que se deveria esperar de um governo “social-democrata”. Reduziu o nível de crescimento da economia a míseros 2.4% ao ano, o que representa um crescimento de apenas 0.8% da renda per capita dos brasileiros ; produziu e sustentou as maiores taxas de desemprego de que se tem notícia na história desse país, reduzindo a renda dos salários e aumentando os níveis de desigualdade social.
Não é, certamente, uma demonstração de sensatez, “deixar ficar como está”… quem sabe para repetir o desastre apontado pelo mesmo ex-ministro de FHC, conforme publicado na Folha de São Paulo de 16/10: “… a equipe econômica e as elites que ela representa (sic) erraram ao adotarem ou apoiarem uma política de altos juros que impede o investimento enquanto aprofunda o endividamento público , e de câmbio baixo, que produz a felicidade no curto prazo à custa da crise cambial anunciada.”
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