Continuar a vigilância

Antonio Delfim Netto (*)

Donna Hrinak, a gentil e eficiente embaixadora dos Estados Unidos, que infelizmente está deixando o Brasil, anunciou esta semana aquilo que já estávamos esperando desde que foi conhecida a decisão da OMC favorável à reclamação brasileira sobre os subsídios à produção do algodão naquele país: “vamos tomar as medidas que a OMC oferece para apelar da decisão”. Confirma-se a idéia que ainda há um longo caminho a trilhar até que a pressão moral e, com o tempo talvez, a racionalidade produzam alguma mudança na política americana. Muita gente nos Estados Unidos acha indecente sustentar um tipo de agricultura improdutiva à custa do orçamento público, mas a posição oficial é recorrer na OMC e usar de todos os meios para reverter a decisão que os obriga a retirar os subsídios.

Decisões do Executivo e do Congresso americano garantem anualmente alguns bilhões de dólares de subsídios ao seu setor primário. O agricultor americano tem a proteção que merece e não é só no caso do algodão, mas de outros produtos igualmente importantes. Eles pagam aos seus agricultores alguma coisa a mais do que o valor de mercado e desta forma estimulam o aumento de sua produção. O aumento da oferta de algodão no mercado derruba os preços externos. Desta forma eles prejudicam duplamente o agricultor brasileiro: primeiro reduzindo os preços do algodão e, segundo, reduzindo nossas exportações devido à competição desigual no comércio exterior. Isso não prejudica só o Brasil mas a todos os demais produtores de algodão.

Já faz 4 ou 5 anos que se iniciou o processo na OMC e finalmente ela decidiu que os EUA promovem um dumping no preço do algodão, através da concessão do subsídio aos seus produtores. De acordo com as regras do comércio internacional, a decisão obriga o país a retirar os subsídios, mas quando se diz que os Estados Unidos vão ser obrigados a fazer alguma coisa é preciso medir bem as palavras… Outras exigências dessa natureza (uma delas tem 30 anos!) já lhes foram comunicadas e não aconteceu nada.

Podemos comemorar a decisão da OMC porque foi sobretudo uma vitória brasileira, devido a uma brilhante atuação profissional e diplomática, mas não dá para baixar a guarda. O Brasil agiu certo quando levou o assunto à OMC, pois somente através das instituições multinacionais se pode impor alguma racionalidade ao processo quando se trata de enfrentar um Estado hegemônico e tão poderoso como os Estados Unidos. Não se imagine que seja possível “derrotar” os Estados Unidos mas é possível, sim, exercer uma pressão moral constante para que respeitem a regras do comércio internacional. O papel da OMC é vital para que eles se sintam moralmente obrigados a obedecer às decisões que todos se comprometem a cumprir quando ingressam nos organismos internacionais. Isso exige que continuemos vigilantes…

(*) E-mail: dep.delfimnetto@camara.gov.br

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