Arquivo revela perseguição a padres

Kamila Fernandes

Documentos sigilosos das Forças Armadas produzidos durante a ditadura militar (1964-1985) e encontrados no Ceará mostram que pelo menos nove padres da zona rural do Estado foram perseguidos e punidos por “atividades subversivas”.

A divulgação foi feita ontem pelo jornal “Diário do Nordeste”, que teve acesso a documentos encontrados em dezembro por uma fonte não identificada e que, segundo essa fonte, seriam destruídos. Os papéis estão sob sigilo e foram entregues a autoridades não reveladas. Uma comissão formada por deputados federais e pela Secretaria Nacional de Direitos Humanos quer analisá-los.

Nos documentos estão ainda fichas e relatórios de pessoas consideradas subversivas e cartilhas de orientação para agentes infiltrados. Entre os vigiados estava o presidente do PT, José Genoino, que na época participava do movimento estudantil no Ceará.

De acordo com esses arquivos, havia uma grande preocupação com certos padres, considerados “inteligentes, ativos e com grande penetração no meio rural”.

Por causa das desconfianças de ações subversivas e comunistas, uma paróquia na praia de Mundaú, no município de Trairi, chegou a ser fechada pela Capitania dos Portos, pois o padre local teria feito críticas às Forças Armadas.

Os relatórios são tão detalhados que contêm, inclusive, a repercussão da punição, como demonstra um trecho de 21 de maio de 1969: “Com relação à condenação de frei Geraldo Bonfim, foi apurado o seguinte: a) no que concerne à maioria da população de Mundaú, não houve ressentimentos contra militares; b) entre a população feminina, notou-se que o fato foi profundamente lamentado, porque “ele é muito bonzinho e ficamos sem vigário”. Entretanto, os pescadores de um modo geral acharam justo, devido, segundo eles, não ser a primeira vez que frei Geraldo aproveitava-se de sermões para fazer críticas”.

O documento, reproduzido na versão impressa do jornal, tem o termo “Confidencial” no alto e no pé da página e tem como origem a Capitania dos Portos do Ceará.

Entre os trechos, está um relatório de 8 de abril de 1970: “Padres Jean e Gabriel, inteligentes, ativos, com grande penetração no meio rural do município de Tauá, neste Estado, fazem reuniões todos os domingos, em diferentes fazendas, e aí celebram missa campal, para depois pregarem suas idéias esquerdistas aos camponeses”.

O então arcebispo de Fortaleza e presidente da CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil), dom Aloísio Lorscheider, hoje arcebispo emérito de Aparecida (SP), afirmou, em entrevista, que sabia que era perseguido pelos militares, por “defender quem julgava que deveria defender”.

O nome de dom Aloísio aparece num texto chamado “Carta Mensal”, do Dops de SP, divulgado pelo jornal, com outros arcebispos que também eram vigiados, entre eles dom Paulo Evaristo Arns.

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