A pressa, a curiosidade e o ódio

João Baptista Galhardo

Correu solto o boato de que o sábio Nasrudin estava morando no condado. Várias pessoas foram procurá-lo e pediram-lhe, como respeitável Mulá (personalidade religiosa) uns ensinamentos. Nasrudin foi para a Praça, já com povo aglomerado e perguntou:

– Vocês têm noção do que eu possa lhes falar?

– Não. Não temos. Responderam todos.

– Então vão para casa porque não vou perder tempo com ignorantes.

Os moradores não se deram por vencidos. Voltaram a lhe pedir um sermão. Ele retornou à praça e perguntou:

– Vocês sabem o que eu poderia falar?

O povo respondeu por unanimidade que sim.

– Bom. Já que vocês sabem, não tenho nada a lhes dizer. Vão embora.

Tempos depois o mesmo convite e a mesma pergunta para os presentes, que mais espertos, metade respondeu que sabia e a outra metade respondeu que não. Disse então o sábio.

– Nesse caso, também não tenho nada a dizer. A metade que sabe ensina a outra metade que não sabe.

Mas o convite foi reiterado. E Nasrudin, comparecendo, ensinou, fazendo perguntas:

– Meus amigos. Vocês querem ter um profundo conhecimento sem dificuldade? Querem verdade sem falsidade? Realização sem esforço e progresso sem sacrifício?

Um grande número de pessoas gritou: “queremos, queremos”. – Pois bem. Disse o Mulá. – Eu só queria saber. Porque o dia em que eu souber lhes contarei tudo a respeito. E se retirou.

Todo mundo vive à procura de conselhos para tornar a vida mais fácil. Nem sempre os aconselhamentos são bons e prudentes. Mas alguns nos instigam à reflexão, como na história de um jovem casal que vivia de favores. O marido com a aprovação da mulher se retirou de casa a procura de trabalho, dizendo que só voltaria quando tivesse condições de lhe oferecer uma vida mais digna e confortável.

– Não sei quando retornarei.

Juraram fidelidade recíproca. Saiu. Andou muito tempo até que encontrou um fazendeiro que lhe deu abrigo e trabalho remunerado. O trabalhador pediu ao patrão que guardasse todos os seus salários, fazendo uma poupança que lhe seria entregue quando pretendesse voltar para casa. Trabalhou durante vinte anos, sem férias e sem descanso. Após esse tempo manifestou o desejo de retornar. O patrão então lhe disse:

– Que você quer? O seu dinheiro ou três bons conselhos?

Depois de muito pensar o trabalhador optou pelos conselhos. Disse então o fazendeiro:

1- Nunca tome atalhos em sua vida. O caminho mais curto e desconhecido pode lhe custar a vida.

2- Cuidado com a curiosidade sobre o que não lhe diz respeito. Pode ser mortal.

3- Nunca tome decisões em momento de ódio ou dor, pois poderá se arrepender e ser tarde demais. Vou lhe dar algum dinheiro para a viagem e estes três pães. Os dois menores para você se alimentar no trajeto de volta e o maior para você comer com a sua esposa quando chegar em casa.

E o homem iniciou o retorno. No primeiro dia encontrou um andarilho que lhe aconselhou um atalho para chegar mais depressa. O rapaz, contente, chegou a iniciar o novo caminho, quando lembrou do primeiro conselho. Voltou e seguiu o percurso normal. Dias depois ficou sabendo que se optasse pelo caminho aconselhado cairia numa emboscada. Mais para frente, cansado, hospedou-se numa pensão à beira da estrada. Pagou a diária, tomou banho e foi dormir. De madrugada acordou ouvindo gritos estarrecedores. Quando se dirigia à porta, lembrou-se do segundo conselho e voltou para a cama. De manhã foi indagado pelo hospedeiro se não tinha ouvido gritos. Disse que sim e que não se importara.

– Você por não ter curiosidade, é o primeiro a sair daqui com vida. Meu filho tem acessos de loucura e costuma matar o hospede curioso, enterrando-o no quintal.

Depois de longa caminhada, ao entardecer, aproximou-se de sua casa, quando viu pela janela sua mulher acariciando um homem. Cheio de ódio e dor resolveu que entraria pelos fundos da casa e mataria os dois de surpresa. Porém, lembrou do terceiro conselho.

– Vou dormir ao relento e amanhã com a cabeça mais fria tomarei uma decisão.

Ao amanhecer resolveu não matar sua esposa nem seu amante. Voltarei ao trabalho, mas antes quero dizer para minha mulher que lhe fui fiel todo esse tempo. Bateu na porta. Entrou. A esposa o reconheceu e se atirou em seus braços. Ele a empurrou. E a chamou de traidora. A mulher lhe explicou que ele a deixara grávida e que aquele homem era o filho dos dois já com vinte anos. O marido contou a sua história e oraram agradecendo a Deus. Quando partiu o terceiro pão encontrou dentro dele todo o dinheiro ganho nos últimos vinte anos.

Muitas vezes o homem paga caro por andar em caminhos desconhecidos; pela curiosidade ao que não lhe diz respeito ou por agir impulsivamente, na hora da raiva ou dor, arrependendo-se tarde demais.

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