João Baptista Galhardo
Por quinze anos sem me desgarrar das atividades registrárias, exerci a Chefia do Comissariado do Juizado de Menores da Comarca. Assim como a Escrivania do Tribunal do Júri. Funções anexas ao Registro de Imóveis. Lidei com delinqüentes adolescentes. Autores de roubos, furtos, lesões, drogas e outras infrações. No Cartório do Júri trabalhei nos processos e servi como Escrivão em duzentos e vinte julgamentos de crimes contra a vida, registrando os interrogatórios, depoimentos, juntando provas, perícias, laudos, etc. Tive a curiosidade de investigar a causa, pelo menos aparente, do cometimento dessas diversas infrações, inclusive as cometidas pelos menores. Colaborei na recuperação de adolescentes envolvidos com infrações e drogas. Eles eram ouvidos juntamente com seus pais. E era perceptível que o epicentro do terremoto criminoso estava dentro da casa de cada um. Dizia com freqüência que era necessário um Juizado de Maiores e não um Juizado de Menores, porque o comportamento destes era conseqüência da conduta daqueles. É de pequeno que se forja a sensibilidade da criança. Desde a amamentação. Mutilada no espírito pela família, difícil a recuperação. Já escrevi anteriormente que não existe prótese para a alma. Para o manco por carência. E a ferramenta é a mais barata de todas: o AMOR, como fonte modificadora do comportamento. Já notava naquela época que a paternidade irresponsável deve ser punida e não premiada. Muitos menores foram recuperados pelo trabalho. E outros quando restabelecida a harmonia familiar. É preciso parar com essa conversa de que o menor não pode trabalhar. A legislação está equivocada. Partem de algumas exceções de exploração infantil para generalizar todas as situações. Pode sim trabalhar. E deve. É claro que em serviço compatível com a idade e em horário não escolar. Não há recuperação de menor em família desagregada. Aliás o que esperar, se a estatística apura que em todas as camadas sociais setenta por cento dos pais bebem exageradamente? Pais despreocupados com o comportamento externo dos filhos. O que fazem? Com quem andam? Onde permanecem até o amanhecer? Pais que só dizem “sim” quando o “não” se impõe. Outros que por comodidade expulsam os filhos do lar. Estudos frustrados. Sem vocação. Hoje muitos ingressam onde for mais fácil. Pouco importa se o curso não servir para nada no futuro. Assim, os filhos fingem que estudam e os pais, pagando, fingem que educam. Não havendo diálogo nem dentro da própria casa o vocabulário encurtou:
– É isso aí. Falou. Legal. É tipo assim. Maneiro.
Leitura nem pensar. Não tendo o exemplo e a experiência do trabalho porque a legislação não permite. Não tendo a vigilância sadia da família. Resta o quê? A escola? Perguntem a um aluno do primário o nome de dois professores. Eles responderão o “tio” de História e a “tia” de matemática. Não é por culpa dos professores. Muitos jovens, ressalvando exceções, já vêm deformados de casa. Acostumados com a falta de educação com os pais e mais acentuadamente com eventual doméstica que lhes serve no lar, tratarão os professores da mesma forma. Como simples prestadores de serviços e não como educadores. A família está gradativamente perdendo o seu dom de amar. Os filhos, que não pediram para nascer, estão, com as devidas ressalvas, virando objeto e só se enturmam porque em bando se sentem prestigiados e importantes. E é aí que mora o perigo. Os homens (em turma) são maus, mas o homem (individualmente) não é desprovido de bondade. É claro que o infrator deve ser retirado da sociedade para que a impunidade não seja prestigiada. Porém os pais devem ser cobrados pela negligência culposa. A prática de crimes por menores só diminuirá quando eles (pais) assumirem, até mesmo por imposição da Justiça, a responsabilidade que devem ter dentro da família.