A escravidão continuou pelo Século 20

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José Renato Nalini (*)

A crueldade é uma companheira recorrente do gênero humano. Ela é atemporal. Está no DNA da espécie que se considera a única efetivamente racional dentre os vivos. Não se pense que a escravidão acabou em 1888. Ela continuou e não se espante se ainda encontrarmos semelhantes vivendo na condição de escravos.

Uma série interessante na Netflix mostra que por exploração religiosa, líderes conseguem fanatizar seus fiéis em nossos dias. Isso chegou à polícia e à Justiça, porque o “chefe” abusou de menores e acabou cometendo crimes. Porém pode existir situação análoga em nossos dias. É preciso vigiar e estar atento: isso é provável que ocorra e perto de nós. É que todos estão muito interessados no próprio umbigo. Desconsiderar o outro abre espaço para deixá-lo vulnerável.

Vale a pena ler o livro “Entre Integralistas e Nazistas – Racismo, Educação e Autoritarismo no Sertão de São Paulo”, escrito por Sidney Aguilar Filho. Ele relata o que aconteceu em Campina do Monte Alegre, no interior paulista. Os Rocha Miranda, família influente do Rio de Janeiro, aderiram ao integralismo, também admiradores de Hitler e de Mussolini.

Dezenas de garotos foram retirados de um orfanato. Tinham entre 9 e 12 anos. Trabalhavam na lavoura a troco de comida. Havia capangas e cães de guarda fiscalizando o trabalho. Havia castigos físicos – a palmatória – e podiam permanecer sem alimentação.

Sidney Aguiar ficou sabendo, por uma aluna sua, que na fazenda da família dela havia tijolos com o símbolo da suástica. Descobriu que a propriedade pertencera a Osvaldo Rocha Miranda e a seus irmãos, membros da Câmara dos Quarenta, um dos órgãos da Ação Integralista Brasileira.

Apurou-se que dos cinquenta meninos levados para a vida de escravo, quarenta e oito eram negros. Osvaldo tinha uma tática para escolher seus garotos. Lá no abrigo, lançava balas do alto e observava os que eram mais ágeis para apanhá-las. Apontava com uma vara os que deveriam ser levados para a fazenda.

Em 2015 ainda havia um deles vivo. Contou que não tinham nome, senão número. Ele era o 23. Acordavam às 5, tomavam banho em uma piscina e às 7 já estavam na roça. Almoçavam às 10, tinham duas horas de aula e voltavam para a labuta. Quando a fazenda foi desativada em 1943, poucos meninos conseguiram se adaptar à vida em sociedade. A maioria morreu jovem, sem família e com cicatrizes pelo corpo.

(*) É Reitor da UNIREGISTRAL, docente da Pós-graduação da UNINOVE e Presidente da ACADEMIA PAULISTA DE LETRAS – 2021-2022. (Imprensa Renato Nalini – e-mail: [email protected])

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