Marcelo Barbieri (*)
O presidente Fernando Henrique Cardoso, após mais uma viagem internacional, resolve pontificar sobre o futuro do Brasil, caso as eleições de outubro entreguem a um “incompetente” os supremos destinos da Pátria.
“Se os próximos governantes forem incompentes, claro. É o que aconteceu na Argentina”, assinalou o presidente, ao ser questionado se o Brasil corre os mesmos riscos da nação portenha.
A manifestação de FHC tem odores de terrorismo eleitoral. Ele teima em tentar sinalizar para a sociedade, assim como o fazem insistentemente Pedro Malan e Armínio Fraga, que se a oposição, qualquer que seja ela, ganhar as eleições presidenciais o País “desanda”.
O chamado “mercado”, segundo os grandes meios de comunicação, está inquieto diante dessa possibilidade. Leia-se “mercado” os poderosos interesses internacionais cravados em nossa economia, notadamente os norte-americanos, que tem no governo dos EUA e em organismos como o FMI e o BID seus principais defensores.
Em que pese o discurso contendo críticas às políticas defendidas pelos EUA, apenas o discurso, FHC adota, desde que assumiu o seu primeiro mandato, uma prática inversa.
Na verdade, o risco do Brasil quebrar, assim como quebrou a Argentina, foi criado pela própria política econômica do governo que, agora, diante da inexorável tendência de seu candidato perder as eleições, tenta jogar a culpa na oposição.
É preciso que se diga com todas as letras que na essência as políticas adotadas na nação vizinha em nada se diferenciam das adotadas no Brasil durante os dois governos de FHC: abertura indiscriminada da economia aos bens e serviços externos; importacionismo que provocou déficits crônicos na balança comercial; descontrole sobre a remessa de lucros das empresas transnacionais – o que provoca igual déficit crônico na balança de serviços; pagamento desmedido dos compromissos com os juros de agiota praticados no mercado internacional.
FHC revela a exata medida de sua competência ao sinalizar que ela é exercida também na exata medida em que é capaz de praticar as políticas ditadas pelo FMI e cia.
O que explodiu na Argentina e pode explodir no Brasil, mantida o atual modelo econômico, são os fundamentos de um sistema falido, que só serve para alimentar as economias decadentes do Norte, particularmente a norte-americana.
A verdade, pelos dados já disponíveis, é que a economia brasileira, desde a Revolução de 30, nunca cresceu tão pouco por um período tão longo. É o que os economistas sérios já alcunharam de “recessão permanente”.
FHC, no auge de competência, resolveu cobrir os rombos com recursos externos, aumentando, ainda mais, a dívida externa e promovendo a desnacionalização da economia. Só para este ano, o governo pretende gastar, incluindo a amortização da dívida, cerca de U$ 50 bilhões, que a equipe econômica quer obter na manutenção de elevadas taxas de juros e com a entrega do patrimônio nacional público e privado ao capital estrangeiro.
A competência do governo pode ser reverenciada, também, ao analisarmos o desenvolvimento da dívida pública interna, boa parte da qual em mãos estrangeiras. O conjunto dessa dívida já atingiu R$ 906 bilhões (72,6% do PIB) em março último, podendo superar R$ 1 trilhão se forem incorporadas algumas dívidas ainda não formalmente assumidas. A dívida considerada líquida, conceito incorreto porque desconta créditos de difícil recebimento, chegou a R$ 680,7 bilhões, o que exige o pagamento, conforme as taxas atuais, de mais de R$ 100 bilhões de juros por ano.
O Brasil, é verdade, só não chegou à situação de insolvência total da Argentina porque a Nação brasileira foi mais forte e resistiu mais ao vendaval neoliberal. Mas se a nau continuar navegando na mesma direção, certamente, estará colhendo as mesmas tempestades que afogam, hoje, os argentinos na mais grave e crônica crise econômica, social e política de sua história.
(*) Deputado Federal pelo PMDB.