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Um ano (inteiro) novo

Maria Aurélia Minervino de Souza (*)

A noite de 31 de dezembro, tão esperada, chegou e com ela a alegria de alguns, a esperança de outros e a total alienação e desencanto de muitos.

Nos relógios, o tempo foi contado em segundos e minutos: 5…4..3…2…1… "O ano virou" e os foguetes brilharam no céu. Entre brindes, abraços, vestidos brilhantes, a festa seguiu nas casas, bares e ruas. Os ponteiros também: 1…2…3…4…5…e não mais pararam…

Na pobreza total de muitos, na solidão silenciosa de alguns, a alegria era apenas sons longínquos, sem inveja, ou qualquer sentimento inferior, pois só se almeja o que um dia se conheceu. Nesta vida acostuma-se com tudo…

Lá fora, o dia que virara noite, noite de festa, se extinguia lentamente para tristeza de muitos e desinteresse de outros.

Os ponteiros dos relógios, alheios a tudo seguiam o seu giro tedioso: 1 hora… 2 horas… 3 horas… 4 horas… 5 horas…, e o povo na rua ainda gritava: Feliz Ano Novo, Feliz Ano Novo.

Quando rompeu a alvorada, na caminha desfeita pela noite mal dormida, "a menina de olhar de sonhos", se espreguiça e pergunta:

– Onde está o Ano Velho, vovó? Coitado! E a festa, os foguetes?

Corre olhar o relógio e os ponteiros continuam incansáveis. Vê o sol entrar pela janela e pergunta:

– Cadê o Ano Novo, vovó? Tudo está como antes…

Na mesa, os restos da ceia, cobertos por uma toalha branca, lembram a festa.

E ela insiste:

– O que mudou vovó?

Com a sensação gostosa de sentir seus bracinhos roliços, em volta do meu pescoço, lhe respondo:

– Na verdade, meu anjo, nada mudou, foi só um dia após o outro.

Curiosa, seu olhar me questiona. Preciso responder, preciso fazer com que ela compreenda.

Busco a palavra certa, pois para uma "menina de olhar de sonhos", as palavras têm que ser verdadeiras.

– Os homens fazem a festa por acreditar nas mudanças, nas coisas boas que o Ano Novo trará, mas isso só depende deles. Muitos nem sonham mais, nem sabem o que é ter esperança.

Olhos tristes me "olham".

Esperança é sonhar, acreditar e alcançar.

– Como, como vovó, poderemos fazer com que todos tenham de novo esperança?

– Fazendo cada um a sua o parte, por menor que pareça. Um Ano Novo, só é novo se nos propusermos. Cada palavra, cada gesto, um simples bom dia numa rua qualquer, para um desconhecido, trará um sorriso de volta, quem sabe?… Ou talvez uma curiosa interrogação mental: de onde a conheço? Mas ai já será uma outra história. Olhos de sonhos me entenderam.

E você vovó, fez a sua parte, e do dia, um bom dia, não?

Novos hábitos, novos gestos, novas palavras. Isto sim é ter um Feliz Ano Novo.

(*) É professora, artesã, poetisa e colaboradora do JÁ.

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